Filosofia

Críton – Questões Sobre a Obra de Platão

A obra de Platão denominado Críton, ou Do Dever, observa-se alguns princípios que, certamente, podem ser considerados verdadeiros axiomas.

Diz respeito à necessidade de tomar em maior conta a opinião dos sábios, não importando se esta é ou não reflexo do pensamento da maioria.

Isso significa que se deve dispensar maior atenção àqueles que conhecem de modo profundo determinado assunto, uma vez que essa experiência é mais proveitosa para o ser humano do que a coleta de opiniões a esmo.

Adequando esse postulado à questão da Justiça, Platão coloca que há apenas um guia seguro para a sua concretização: a Verdade.

Resumo da obra:

Sócrates está na prisão. Espera por trinta dias para a execução de sua sentença.

Recebe a visita de Críton, seu discípulo. Críton chega bem cedo a prisão e encontra Sócrates dormindo. Como pode dormir tranquilamente quem está para morrer/ Sócrates responde que não tem medo da morte e, pergunta: o navio já chegou? Não, mas tive notícias que está para chegar.

Críton, você coloca em risco a nossa reputação fazendo a proposta de fuga. O povo irão dizer que somos falsos amigos, por não pagar a fiança. Críton, vocês estão preocupados com a opinião popular? Sócrates, você tem a oportunidade de fugir e viver no estrangeiro. Seus filhos poderão ser distratados e morrerem na miséria. Críton, eu vou seguir o seu conselho, desde que você demonstre que fugindo de Atenas não estou contra os inocentes e contrariando as leis.

Sócrates, você está vivo, falou na cidade, tem formação e educou os filhos. Tudo foi dado pelas leis porque casamos teus pais, educou a si e a teus filhos.

A possibilidade de que não concordando com as leis, pagar fiança e ir embora. Você fez um compromisso: sofistas – retórica de linguagem; se sua palavra não se mantiver estará rompendo conosco. Se nos banalizar o que será dos inocentes?

É um tratado sobre as leis, enfocando o que proporciona aos homens. Antes sofrer uma injustiça do que pagar uma injustiça com injustiça.

Conclui que não deve pagar com uma injustiça.

Sócrates foi considerado positivista pelo apego às leis. A obediência às leis é o caminho certo para chegar a justiça. As leis não tem, necessariamente a justiça.

Diante dessa breve exposição, pode-se concluir que há pontos assinalados pelo pensador grego que merecem prestígio, necessitando ser enfatizados, porque esquecidos. Trata-se da crença na verdade e da necessidade de obediência às Leis.

As propostas de Críton e de Sócrates

Críton:

“Contudo, querido amigo Sócrates, pela última vez, convém seguires meus conselhos e te salvares. De minha parte, além da desventura de ser privado para sempre de ti, de um amigo de cuja perda ninguém conseguirá suavizar-me o sofrimento, receio que muitos que não nos conhecem julguem que, tendo eu a possibilidade de salvar-te pagando o que fosse necessário, optei por deixar-te morrer e te abandonei. Existe algo mais vergonhoso do que ser considerado maior apreciador do dinheiro que dos amigos? Porque o povo não conseguirá atinar com o fato de que te tivesse negado a sair quando era o que tanto queríamos que fizesses”.

Sócrates:

“Teu empenho teria sido muito louvável, meu caro Críton, se estivesse de acordo com as normas da justiça; porém, ao contrário, será tanto mais merecedor de desonra quanto mais distante dela estiver. Em princípio, teremos de analisar se devemos ou não fazer o que dizes, porque já sabes que é antigo meu hábito de não me sujeitar a outras razões que não à única que me pareça mais justa, após analisar todas as que são apresentadas. Mesmo que o destino esteja contra mim, jamais poderei abandonar os princípios básicos que sempre professei, pois sempre se me afiguram os mesmos e sempre os estimo em igual maneira. Se, por conseguinte, não encontramos razões sólidas, convence-te de que não me sujeitarei às tuas, ainda que todo o poder do povo se lançasse contra mim, e tu, para amedrontar-me, me ameaçasses como a um garoto com mil espantalhos, falando-me de sofrimentos mais cruéis do que minha presente desventura, com cadeias, perda de minha fortuna e morte.

Contudo, como realizar essa análise com honestidade? Sem dúvida recordando o que dizias agora há pouco a respeito das opiniões, isto é, se há opiniões que devem preocupar-nos e outras que podemos não levar em conta. Por acaso, o que eu disse não foi razoável até antes de haver sido pronunciada minha sentença e depois terá de permanecer no ar como conversa inútil e, no fundo, como brincadeira e jogo de crianças? Quero analisar este assunto contigo e examinar se, em minha nova situação, este princípio me parecerá distinto, ou se permanecerá sempre o mesmo, para que nos determinemos a abandoná-lo ou segui-lo. Salvo engano meu, a verdade é que sustentei muitas vezes, diante daqueles que julgavam dizer coisas sérias, que algumas opiniões humanas devem ser tidas em alta conta e outras, não. Críton, pelos deuses, crês também nisto? Porque, conforme as aparências humanas, não corres risco imediato de morte e deve-se supor que não há nenhum risco que corras neste momento que te embarace a percepção e te induza ao erro. Pensa bem. Não julgas que se disse com muito acerto que não devem ser consideradas todas as opiniões dos homens, mas somente algumas, e não as de todos os homens, mas somente as de alguns? Que achas? Não falam corretamente aqueles que afirmam isto?”

Tem-se aqui o primeiro dos axiomas: o emprego necessário da Verdade. Obviamente, cabe ao Advogado elaborar suas alegações da maneira mais favorável possível aos interesses de seu representado. O que não se pode admitir, é a utilização de argumentos sabidamente falaciosos e inverídicos, vez que isso em nada contribui para a realização da Justiça.

De fato, é tarefa própria do advogado apresentar para o Juiz todas as possíveis alternativas para que o mesmo decida o conflito favoravelmente a seu cliente. Todavia, não pode se deixar de levar em consideração que esta atividade encontra limites na Verdade e, em última análise, no quanto disposto pelas Leis. Não se pode buscar a vitória a qualquer custo.

A coerência socrática em:

3.1 – obediência às leis.

“Se no instante de nossa fuga, ou como queres denominar nossa saída, as leis da República nos dissessem: Sócrates, o que vais fazer? Executar teu plano não significa aniquilar-nos completamente, sendo que de ti dependem as leis da República e as de todo o Estado? Acreditas que um Estado pode subsistir se as suas sentenças legais não têm poder e, o que é mais grave, se os indivíduos as desprezam e aniquilam? Que responderíamos, Críton, a essas e outras acusações semelhantes? Quantas coisas não poderiam ser ditas, até mesmo por um relatório, a respeito do aniquilamento dessa lei que exige o cumprimento das sentenças emitidas? Por ventura responderíamos que a República foi injusta e nos julgou mal? É isso que diríamos?”

Em verdade, para que se concretize o ideal de dar a cada um o que é seu, deve-se ter por base um critério. Esse critério, cujo respeito se impõe a todos, não é outro senão àquele estabelecido pelas Leis.

Sócrates afirmava que se deve sempre se pautar pela utilização da verdade, ainda que não se saiba exatamente a sua real amplitude. Não se pode argumentar com elementos sabidamente falsos.

De outro lado, tem-se que a atuação dentro das Leis também é imprescindível para a correta consecução do ideal personificado na profissão. De fato a obediência às Leis é condição necessária, ainda que insuficiente, para a concretização da Justiça.

3.2 – é permitido fazer mal ao inocente?

“É justo, como o povo pensa, pagar o mal com o mal? Ou é injusto?”

A análise do respeito às Leis, mesmo às injustas.

De acordo com o filósofo grego, não se deve nunca cometer uma injustiça, vez que esta se confunde com o conceito de mau, e é evidente que os homens devem atuar de modo bom.

Sendo assim, não é correto que o Advogado, na efetivação da tarefa inerente à profissão, ignore uma lei por considerá-la injusta. Deve obedecê-la, ainda que não concorde com seus termos. Não se pode pagar um injustiça com outra, nem desrespeitar as Leis sempre que convém, vez que Leis inaplicáveis são como inexistentes.

Nesse passo, é fundamental notar que as Leis são o parâmetro da atuação do profissional do Direito, mostrando-se ora como fonte de liberdade, ora como restrição.

Em verdade, para que se concretize o ideal de dar a cada um o que é seu, deve-se ter por base um critério. Esse critério, cujo respeito se impõe a todos, não é outro senão àquele estabelecido pelas Leis.

Desse modo, tem-se que cabe ao Advogado aceitar e fazer valer o quanto disposto nas Leis. Atuando desse modo, certamente estará auxiliando na difícil busca da efetivação da Justiça.

Finalmente, cabe ressaltar que, embora a veracidade desses ideais seja de difícil questionamento, sabe-se que a sua consecução também não é tarefa fácil. Contudo, a busca incessante pela efetiva realização desses ideais certamente aperfeiçoa o ser humano, acarretando benefícios para todos os componentes da sociedade.

Em verdade, se todos os indivíduos fossem irrestritamente justos, não haveria conflito, nem Direito. Todavia, isso não irá jamais ocorrer dada a complexidade da natureza humana, a qual, embora seja objeto constante da preocupação dos estudiosos, também é razão do eterno fascínio do homem para consigo mesmo.

Os conceitos trabalhados no diálogo

  • Crença na Verdade
  • Obediência as Leis
  • Justiça
  • Injustiça
  • Opinião pública

Por: Arthur Montenegro Campos

Veja também: