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Argentina

A característica mais peculiar da Argentina é a convivência histórica entre a forte herança cultural europeia e as tradições rurais e regionalistas. O poderio econômico da oligarquia latifundiária não impediu que o país conquistasse níveis de desenvolvimento próprios de nações do primeiro mundo. O alto grau de escolaridade da população, o nível da renda e o avanço e a diversificação da economia fazem dos argentinos um povo privilegiado entre os sul-americanos. Sua conturbada história política contemporânea e a dependência ao capital estrangeiro, no entanto, fecharam-lhe o caminho do pleno desenvolvimento.

População

Ao contrário de quase todos os outros países da América do Sul, o europeu branco tornou-se o principal componente racial do povo argentino. A distribuição geográfica da população mostrou-se desigual, com uma concentração cada vez maior nas metrópoles litorâneas e nas regiões férteis do interior.

Havia poucos habitantes no país quando principiou a colonização espanhola. Alguns dos grupos indígenas existentes, sobre os quais ainda influía a civilização dos incas, ocupavam pequenas áreas das elevações dos Pampas, nas proximidades da cordilheira, nos vales dos rios Paraguai e Paraná. Eram os araucanos, guaranis e diaguitas, estes mais assemelhados aos quíchuas. A luta contra as belicosas tribos caçadoras e a escassa afluência de imigrantes mantiveram o crescimento demográfico em níveis relativamente baixos durante o período colonial. Quando o país proclamou sua independência da Espanha (1816), não tinha mais de 400.000 habitantes.

Bandeira da Argentina

Da segunda metade do século XIX em diante, a Argentina passou a estimular ao máximo a mobilização de imigrantes europeus para ocupar suas regiões mais férteis. Em 1860 a população já subira para mais de 1.700.000 e meio século depois tinham chegado seis milhões de imigrantes, verificando-se o predomínio constante dos espanhóis e italianos, a que se juntava um contingente originário da própria América do Sul. Esse fluxo migratório foi além da segunda guerra mundial, mantendo-se até 1956.

De 1960 em diante a instabilidade política e os problemas econômicos alimentaram o processo inverso, levando muitos cidadãos argentinos a emigrarem para outros países. Apesar disso, a população em geral continuou crescendo, mas moderadamente, a uma taxa média anual de 1,5%. Além de Buenos Aires, tornaram-se importantes as cidades de Córdoba, Rosario, Mendoza e Mar del Plata, com grande concentração demográfica.

O índio e o negro praticamente desapareceram. Embora o elemento mestiço seja substancial nas províncias contíguas ao Chile, Bolívia e Paraguai, e haja comunidades de índios puros no noroeste do país, os centros populosos da Argentina, e em particular a capital, tornaram-se quase cem por cento brancos. No fim do século XX, o território argentino abrigava pouco mais de cem mil indígenas.

Economia

A falta de uma sólida infra-estrutura industrial, a escassez de capitais, a exportação fundamentada no setor primário, os conflitos sociais e trabalhistas e a instabilidade política foram alguns dos empecilhos à prosperidade de um país que, se não é subdesenvolvido, apresenta aspectos próprios das economias do Terceiro Mundo.

Na segunda metade do século XIX, a Argentina registrou rápido desenvolvimento econômico, com a colonização do Pampa e o início das exportações. Todavia, a distribuição das terras entre grandes latifundiários e pequenos proprietários e a ausência de uma autêntica classe média agrária cercearam a renovação técnica da lavoura. A economia argentina tendia à estagnação e a uma excessiva dependência das flutuações do mercado internacional. Essas deficiências estruturais ficaram patentes a partir de 1930, quando os mercados americano e europeu se fecharam aos produtos agropecuários.

A estagnação econômica aprofundou-se depois da segunda guerra mundial, apesar dos esforços do governo para industrializar o país e minorar os efeitos da inflação crescente. A crise de 1958, a seca de 1962 e a alta nos preços do petróleo na década de 1970 agravaram ainda mais os problemas econômicos da nação. Houve tentativas para resolvê-los com planos de desenvolvimento agrícola e industrial, cujo êxito nem sempre foi o desejado. A exploração das jazidas petrolíferas a partir de 1967, o aumento na produção de energia hidrelétrica e a ampliação e aperfeiçoamento dos sistemas de irrigação foram algumas das principais conquistas da Argentina no plano econômico, na segunda metade do século XX.

Agricultura e pecuária

Com seus diferentes solos e condições climáticas, a Argentina pôde diversificar sua produção agrícola em culturas intensivas e adequadas às características de cada região. A meta principal tem sido a dos cereais. Faz-se ótima rotação, nos Pampas, de trigo e milho com linho e alfafa. Cultivam-se também o centeio, a cevada, a aveia e, na Mesopotâmia, o arroz.

Nas províncias de San Juan e Mendoza, cujos vales foram contemplados com expressivas obras de irrigação, desenvolveu-se variada fruticultura, que incluem vinhedos, olivais e diversas espécies cítricas, como o limão, a laranja e a toranja (grapefruit). Concentram-se nessas terras os melhores produtores de vinho, que o exportam para muitos países. Outras províncias em que se plantam frutas são Catamarca, La Rioja e Río Negro.

Em Misiones, as plantações são de chá e erva-mate, de alto consumo interno. A cana-de-açúcar, primordial na indústria de alimentos, é cultivada principalmente em Tucumán e, em proporções menores, nas províncias de Salta, Jujuy e Chaco. Nesta última também se tornam importantes outras culturas de notável valor industrial como a das sementes oleaginosas (soja, sorgo, girassol e linhaça) e a de fibras têxteis, especialmente linho e algodão, devendo-se ainda lembrar o tabaco, plantado também em Salta e Misiones.

Por muito tempo a pecuária foi a maior, se não única, riqueza dos argentinos. No século XVII constituía uma criação de subsistência e só se comercializava o couro. Quando se inventou e se começou a usar a técnica do charque, em meados do século XVIII, o país passou a exportar carne. No fim do século XIX, a seleção de espécies bovinas, o emprego de grandes frigoríficos e a ligação ferroviária dos centros criadores com os portos de Buenos Aires, Rosario e Bahía Blanca tornaram possível a exportação de carne bovina em grande quantidade, inclusive para os Estados Unidos e Reino Unido.

O mercado interno foi importante desde o início, pois a carne é tradicionalmente um dos componentes principais da alimentação argentina.

Embora disponha de matas que comportam, sem agressão ecológica, uma exploração equilibrada e potencialmente rentável, a Argentina ainda não desenvolveu a silvicultura, em grande parte devido à distância das fontes de matéria-prima em relação aos grandes centros. Na província de Misiones, o pinheiro, o cedro e o pau-rosa vêm sendo aproveitados no fabrico de celulose. Em Santiago del Estero, do quebracho se extrai madeira dura e tanino. Nas montanhas da Patagônia, o pinheiro e o lariço têm crescente utilização econômica.

A atividade pesqueira, de enorme potencial nas costas da Patagônia, é dificultada pela falta de mão-de-obra e de portos nessa região. Os hábitos alimentares da maior parte da população excluem quase completamente o consumo de pescado.

Minas e energia

A Argentina é rica em recursos minerais, que permanecem em grande parte inexplorados por falta de uma relação adequada entre as riquezas naturais e os meios dedicados a seu aproveitamento. O noroeste é a região em que se acham os centros de mineração mais importantes. Ali se extraem chumbo, estanho, zinco, ouro, prata, cobre, ferro, bismuto, tungstênio, volfrânio, manganês, amianto, além de gesso e sal. Entre os minerais não-metálicos, sabe-se de valiosos depósitos de cobalto, enxofre, tântalo e urânio. Há também importantes concentrações de ferro em Río Negro e outros pontos da Patagônia.

Com parcas jazidas de carvão no extremo sul de seu território, a Argentina, desde o princípio do século, teve bons resultados na extração de petróleo e gás natural. Seus lençóis de maior produtividade e potencial localizam-se nas províncias de Chubut (especialmente em Comodoro Rivadavia), Santa Cruz, Río Negro, Neuquén e Salta. A estatal do setor, Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF), assumiu em 1922 o controle da produção do petróleo e de sua importação. Na década de 1980, o petróleo e seus derivados constituíam dez por cento das importações argentinas, embora durante esse período o crescimento da produção nacional caminhasse rapidamente para a autossuficiência. Aumento ainda mais auspicioso vinha tendo a extração de gás natural, de procura cada vez maior na expansão do parque industrial e das comunidades urbanas. As jazidas de gás se acham junto aos lençóis petrolíferos e modernos gasodutos fazem sua ligação com Buenos Aires e Bahía Blanca.

Os rios que descem da fronteira oeste e grande extensão dos que cortam o nordeste argentino — basicamente as bacias do Paraná e Uruguai — encerram alto potencial hidrelétrico. As usinas existentes foram construídas na serra de Córdoba, no rio Uruguai e no Río Negro. Havia imensas represas em construção, em particular a da hidrelétrica de Yaceretá, em cooperação com o Paraguai, mas a maior parte da eletricidade do país, no início da década de 1990, provinha de usinas termelétricas. Nessa mesma época, a Argentina dispunha das maiores instalações de energia atômica da América Latina, na usina de Atucha.

Indústria

Apesar dos problemas estruturais de sua economia, a Argentina destacou-se como um dos países mais industrializados da América do Sul, com grande potencial de desenvolvimento. Nas duas últimas décadas do século XIX, surgiram as primeiras fábricas, voltadas para o beneficiamento de produtos agropecuários destinados à exportação. Além disso, começou a construção das principais estradas de ferro e das instalações portuárias de Buenos Aires e de outras cidades do litoral atlântico.

Durante a primeira guerra mundial, enquanto a exportação de alimentos recebia novo impulso, a importação de manufaturados foi praticamente suspensa. Como no caso do Brasil, o fato representou poderoso estímulo para a expansão industrial, já que foi preciso substituir os bens de consumo até então importados por similares produzidos internamente. O processo encontrou graves obstáculos na crise de 1929, que afetou todo o mercado mundial e deu origem a um difícil período de estagnação da economia argentina por toda a década de 1930 até a segunda guerra mundial, que levou a um novo surto de exportação de alimentos e de industrialização.

No início da década de 1990, a indústria argentina de transformação, sobretudo alimentícia e têxtil, abrangia uma vasta relação de produtos, entre os quais se destacavam, pela quantidade e qualidade, açúcar, conservas de origem vegetal e animal, azeite de oliva, óleos vegetais, cerveja, vinho, álcool, fibras de algodão, lã e sintéticos.

Apesar do modesto desempenho das indústrias siderúrgica e metalúrgica argentinas, não diminuiu nos últimos anos a capacidade de produção das montadoras de automóveis, tratores e mesmo, em escala menor, veículos militares e aviões. Os maiores centros industriais, além de Buenos Aires, são Córdoba, Tucumán, Rosario, Mendoza, Salta e Jujuy. Um setor que tomou forte impulso graças à produção petrolífera nacional foi o da indústria química, representado por numerosas fábricas de medicamentos, fertilizantes, colas, ácido sulfúrico, metanol, etileno, propileno, soda cáustica e pneus. Também não podem ser esquecidos dois outros itens de expressão considerável, o cimento e o papel.

Comércio, turismo, finanças

As exportações argentinas são constituídas, fundamentalmente, de produtos agropecuários (cereais, frutas, verdura, forragem, óleos vegetais, manteiga, carne e derivados, couro e peles), mas na segunda metade do século XX observou-se uma crescente participação da indústria nessa atividade, particularmente no que diz respeito aos derivados de petróleo. Em contrapartida, o país tem uma pauta de importações que prioriza o próprio petróleo com que ainda complementa sua produção, matérias-primas industriais, produtos químicos, máquinas e veículos de transporte. Os parceiros mais importantes do comércio exterior argentino são a Comunidade Europeia (CE), a Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), os Estados Unidos e a Comunidade de Estados Independentes (CEI).

A Argentina tem bancos estatais e particulares, um grande número de estabelecimentos cuja atividade se exerce sob controle do Banco Central, que também preserva as divisas estrangeiras e o lastro de ouro, além de emitir a moeda. Da década de 1960 em diante, o país enfrentou o aumento da inflação, que chegou a ultrapassar a marca dos mil por cento. Após um período de contínua desvalorização da moeda, o governo argentino criou o peso novo em 1970, equivalente a cem pesos antigos. Em 1983 houve outro ajuste monetário e um novo peso foi lançado, valendo dez mil do anterior. Em 1985 outro acerto se tornou premente e deu-se à moeda o nome de austral, com o valor de mil novos pesos. Dessa fase até o início da década de 1990 houve um período de relativa estabilidade, com a adição de programas econômicos de controle da inflação e de saneamento das finanças do estado.

Em abril de 1991, a lei de livre conversibilidade da moeda dolarizou a economia argentina, que experimentou a partir de então um significativo decréscimo do processo inflacionário. Sua intensidade ao longo de muitos anos, todavia, fez crescer e agravar-se outro pesado ônus da economia nacional: a dívida externa, uma das maiores do continente.

Transportes e comunicações

A hipertrofia urbana e a enorme centralização da metrópole portenha exerceram influência determinante no traçado original do sistema viário argentino, um dos mais extensos da América Latina. Em função do desenvolvimento agropecuário nos Pampas e no Chaco, essas regiões tiveram o privilégio de ótima comunicação com a capital federal, em detrimento de muitas paragens do sul ou dos Andes, que se mantiveram ilhadas.

As estradas de ferro começaram a ser implantadas no país em pleno século XIX, com capital e técnica estrangeiros, especialmente ingleses e franceses. A partir de 1947, o estado tornou-se responsável pela propriedade e conservação de toda a rede que chegava na década de 1990, a 35.000km, mais do que em qualquer outro país latino-americano, com destaque para a estrada de ferro que ligava Buenos Aires a Valparaíso, no Chile, através dos Andes.

A partir da segunda metade do século XX, com a produção automobilística, as estradas de rodagem aumentaram em quantidade e volume de tráfego, embora a rede ferroviária continuasse a ser utilizada para aproximadamente a metade do transporte de carga. Rodovias de primeira classe vão de Buenos Aires a Rosario, Córdoba, Tucumán, Bahía Blanca e Neuquén. A Argentina também se liga aos países limítrofes e ao resto do continente pela rodovia Pan-Americana.

A Argentina tem em Buenos Aires seu mais importante porto internacional e de cabotagem — por mar e pelos rios –, vindo em seguida La Plata e Bahía Blanca. A navegação fluvial estende-se a mais de três mil quilômetros de distância do mar, pelos rios Paraná, Paraguai, Uruguai e Negro, sendo seus respectivos portos principais Rosario, Santa Fe, Concepción, Formosa e Neuquén.

O transporte aéreo, de importância crescente, está a cargo de várias companhias nacionais (especialmente as Aerolíneas Argentinas) e estrangeiras. Os principais aeroportos internacionais são o de Ezeiza, a quarenta quilômetros de Buenos Aires, e o Aeroparque, no centro da capital.

A Argentina possui uma das mais extensas redes de telefonia da América Latina, a maior parte instalada em Buenos Aires. A Empresa Nacional de Telecomunicações realiza os serviços de comunicação internacional por satélite e é responsável pela renovação das redes de telegrafia e radiotelegrafia.

História

Desde os começos da ocupação de seu território, em que o próprio pioneirismo parecia pautado por objetivos e atitudes conflitantes, a Argentina sempre viveu sua história com luta e inquietação, rivalidades regionais, divergência entre classes e facções. No meio dessas chamas politizou-se, adquiriu vigorosa combatividade social e perfil inconfundível como nação, mas até hoje tem problemas para se integrar em torno de uma perspectiva segura e de decidido projeto nacional.

Descobrimento e colonização

É difícil afirmar qual o primeiro navegador que pisou em terras argentinas. Pode ter sido o florentino Américo Vespúcio e podem ter sido portugueses. Foi em nome da coroa espanhola, porém, que se fez a comunicação oficial do descobrimento, sob a responsabilidade de Juan Díaz de Solís, que desembarcou (1516) em Candelaria (hoje Maldonado), descobrindo o mar Dulce ou de Solís, mais tarde rio da Prata. O navegador pereceu pouco depois com quase todos os seus homens, atacado — e provavelmente devorado — por guaranis. Uns poucos remanescentes chegaram ao Brasil, contando fantásticas histórias sobre o império de um rei branco onde haveria uma montanha repleta de prata. O relato, que lhe teria chegado pelos índios, por certo se referia aos incas, então ainda não conquistados. Para portugueses e espanhóis, o portal daquele prodígio devia ser o “río de la Plata”.

O território argentino, nessa época, era habitado por diversos povos indígenas, somando uma população que beiraria os 300.000. Os espanhóis tentaram utilizá-los como mão-de-obra, o que só chegou a dar certo com os que já se dedicavam à agricultura, no norte da Mesopotâmia e nas serras do noroeste. No entanto, no sul da Mesopotâmia, no Chaco, nos Pampas e na Patagônia, as tribos de caçadores mostraram-se hostis à colonização, opondo-lhe constante resistência.

Seis anos depois de Fernão de Magalhães descobrir o estreito que tomou seu nome e liga os oceanos Atlântico e Pacífico, o genovês Sebastiano Caboto entrou no estuário do Prata, fundou a fortaleza de Sancti Spiritus e, embora não achasse prata, teve novas informações sobre um vasto império a noroeste da região. Foi o ponto de partida para o interesse do imperador espanhol Carlos V, que confiou a colonização do território a Pedro de Mendoza. Este, em 3 de fevereiro de 1536, fundou o forte de Nuestra Señora Santa María del Buen Aire, núcleo inicial da cidade de Buenos Aires, logo abandonado (1541) aos índios que o atacavam. No ano seguinte seria fundada a cidade de Assunção (mais tarde capital do Paraguai), a partir da qual as terras argentinas passaram a ser colonizadas.

Com a conquista do império inca, as atividades econômicas da bacia do rio da Prata passaram à função de abastecer os trabalhadores da mineração no vice-reinado do Peru. Juan de Garay fundou Buenos Aires pela segunda vez em 1580, enquanto surgiam outros centros urbanos na rota para Assunção: Santiago del Estero (1553), Mendoza e San Juan (1562), Tucumán (1565), Córdoba e Santa Fe (1573), Salta (1582), Corrientes e Paraná (1588) e La Rioja (1591). A divisão e administração da terra sob o regime das encomiendas não deu bons resultados por falta de mão-de-obra habituada ao trabalho agrícola. A principal atividade econômica passou a ser a vaquejada, ou caça de gado selvagem, praticada pelos gaúchos (mestiços de espanhol e índio, nesses tempos de rara imigração). Os missionários jesuítas, a partir de 1585 e particularmente na província de Misiones, lançaram as bases da educação nacional.

O vice-reino do Peru em 1617 dividiu o governo do Paraguai e Rio da Prata em duas províncias — de que Asunción e Buenos Aires se tornaram as capitais –, enquanto a de Tucumán viu-se palco de um choque permanente dos colonizadores (vindos do Chile e Peru) com os índios da região, a duras penas subjugados. Em 1776, do largo território que compreendia a atual Argentina, o Paraguai, o Uruguai e o sul da Bolívia, fez-se um vice-reino à parte, tendo Buenos Aires como capital. Foi seu primeiro grande impulso.

Com a legislação do Comércio Livre da Espanha e Índias (1778), a cidade passou a ter enorme movimento como porto, em negócios — principalmente de couro — com o Brasil, a Grã-Bretanha e a França. As vantagens assim auferidas pelo entreposto portenho alimentaram a rivalidade de outros pontos e províncias da futura nação.

Independência e unidade

Estimulados pela recente aliança franco-espanhola, os ingleses em 1806 tomaram Buenos Aires. A cidade foi reconquistada pelas tropas de Santiago Liniers, mas diante da evidente insuficiência das forças espanholas para defendê-la, seus moradores organizaram-se em milícias. Sob influência da revolução francesa, uma burguesia urbana esclarecida derrubou o vice-rei Rafael de Sobremonte, colocando Liniers em seu lugar. Era o tempo das guerras napoleônicas; Espanha e Portugal foram ocupados. Em Buenos Aires, a hora era propícia à “revolución de mayo”: em 25 de maio, uma assembleia de notáveis (a que pertenciam Manuel Belgrano e Mariano Moreno) depôs o vice-rei, que na época era Baltasar Hidalgo de Cisneros, e elegeu presidente o tenente-coronel Cornelio Saavedra.

Não houve, ainda, declaração de independência. Esperava-se a normalização da situação na Espanha, com a restauração de Fernando VII. Entrementes, o país se dividia. A junta derrotou os insubordinados de Córdoba e do Alto Perú, mas encontrou dificuldades com o Paraguai e a Banda Oriental (mais tarde Uruguai), onde o patriota José Gervasio Artigas batia-se bravamente. A parte boliviana foi retomada (1811) pelo vice-reino do Peru.

Os anos seguintes foram difíceis, mas produtivos. Desentendiam-se federalistas e unitários, revolucionários e moderados, republicanos e realistas. Uma Assembleia Constituinte (1813) reconheceu a liberdade dos nascidos escravos, extinguiu os tributos pagos pelos índios, acabou com os títulos de nobreza, liberou a exportação de cereais, instituiu o escudo e o hino nacional e escolheu como bandeira a que Manuel Belgrano criara um ano atrás. Em 1814, Fernando VII restaurou a monarquia. Após algumas dissensões e obstáculos, o congresso reunido em Tucumán a 9 de julho de 1816 proclamou a independência das Províncias Unidas do Rio da Prata.

O governo deu apoio à campanha do general José de San Martín, que atravessou os Andes, derrotou os espanhóis em Chacabuco, e depois, com Bernardo O’Higgins, libertou o Chile nos combates de Maipú. San Martín, indiferente ao poder, ainda seguiu para o Peru e tomou parte (1824) na batalha de Ayacucho, que liquidou o domínio espanhol na América do Sul. Enquanto isso, a Banda Oriental era tomada pelos portugueses e os federalistas se sublevavam. A Assembleia Constituinte, já em Buenos Aires, reforçou o executivo e promulgou a Lei Fundamental de 1816, unitária e por isso rejeitada pela maior parte das províncias. Elegeu-se, então, o primeiro presidente da república, general Bernardino Rivadavia.

De 1825 a 1828 em guerra com o Brasil, que anexara a Banda Oriental como província Cisplatina, os argentinos, com mediação inglesa e em acordo com os brasileiros, reconheceram a independência do Uruguai. Internamente, federalistas e unitários chegavam à guerra civil: à frente dos primeiros, Juan Manuel de Rosas tomou o poder e impôs violenta ditadura (fim de 1829).

Seu governo foi tumultuado, mas militarmente bem-sucedido: derrotou os índios no sul, venceu a confederação Peru-Bolívia e enfrentou a França e a Grã-Bretanha, que respaldavam os uruguaios em constantes conflitos com a Argentina. Todavia, o governador de Entre Ríos, Justo José de Urquiza, auxiliado por tropas uruguaias e brasileiras, derrubou o ditador (1852) ao destroçar suas forças na batalha de Caseros.

Mas a desunião continuava Contra esta, a Confederação Argentina foi fundada em San Nicolás e, em Santa Fe, preparou-se nova carta centralizadora, ainda que à revelia de Buenos Aires, que acabou por ceder à pressão exercida pelas províncias, militarmente persuasivas. Urquiza fomentou a agricultura e a educação, mas só a partir de 1862, com a eleição de Bartolomé Mitre para a presidência, iniciou-se uma etapa de mais união e prosperidade.

Houve, em seguida, a guerra do Paraguai. Em 1865, sendo a província de Corrientes invadida pelos paraguaios, a Argentina compôs com o Brasil e o Uruguai a Tríplice Aliança. Foram cinco anos de fogo e sangue, com milhares de mortos, que terminaram na vitória aliada. Com os governos de Domingo Faustino Sarmiento (1868 a 1874), que fortaleceu a administração e a escola pública, de Nicolás Avellaneda e do general Julio Argentino Roca (1880 a 1886), que acabou de esmagar a resistência indígena, o país consolidou-se politicamente e Buenos Aires tornou-se o Distrito Federal.

Século XX. Em torno de Roca e da prosperidade econômica, a organização social mostrava-se essencialmente conservadora e oligárquica, com base nos proprietários de terra e nos comerciantes: as exportações aumentavam, a imigração aproximava-se de seus melhores dias, intensificava-se a expansão do transporte ferroviário e a indústria leve já dava os primeiros passos, mas o poder e a riqueza estavam rigidamente concentrados. A crise da última década do século XIX, perturbadora, despertara revoltas. Criaram-se a Unión Cívica Radical, os primeiros núcleos de organização operária e ouviram-se as vozes do socialismo e do anarco-sindicalismo.

Havia denúncias de fraude em várias eleições. Reclamava-se a democratização do processo e, por iniciativa do presidente Roque Sáenz Peña, a reforma eleitoral instituiu, de 1914 em diante, o voto secreto e obrigatório para todos os homens. A mudança possibilitou a vitória (1916) do grupo radical. O primeiro presidente eleito de forma legitimamente democrática foi Hipólito Irigoyen, a um tempo paternalista e repressivo para com os operários, como na greve geral de Buenos Aires (1919), em que se valeu até do exército. Em seu segundo mandato, no qual sucedeu a Marcelo T. de Alvear, alcançou muita popularidade, que perdeu com a crise de 1929, de funda repercussão no país.

Nova maré conservadora inundou a Argentina, no meio de complicados problemas econômicos, sobretudo na relação com os ingleses, que no intercâmbio comercial se voltavam então quase exclusivamente para a própria Comunidade Britânica. Veio o golpe militar de 1930, de influência fascista, em virtude do qual ocuparam o poder os generais José Felix Uriburu e, em seguida, Agustín Pedro Justo, este por meio de eleições, ainda que fraudulentas. A Argentina, que declarou-se neutra na segunda guerra mundial, como fizera na primeira, foi dominada por variadas tendências de autoritarismo; civil, nos casos de Roberto Ortiz e Ramón Castillo; militar, em sucessivas experiências do período. Por pressões americanas, em 1944 teve de declarar guerra à Alemanha e ao Japão.

Por volta de 1943, começara a destacar-se a personalidade do coronel Juan Domingo Perón, que foi subsecretário da Guerra e ministro do Trabalho. Cativando especialmente os trabalhadores e descamisados, as camadas subalternas da igreja e das forças armadas, bem como uma parte do empresariado, Perón elegeu-se presidente da república em 1946, com 55% dos votos. Ajudara-o na campanha Eva Duarte (Evita), que se tornou sua mulher e tenaz colaboradora.

A ideologia peronista, chamada por ele justicialismo, configurou-se como um populismo autoritário e preocupado com a justiça social, com o progresso representado pelo desenvolvimento das indústrias, com o nacionalismo. Fizeram-se algumas reformas importantes, como a instituição do voto feminino e a criação dos sindicatos operários, mas não se fez nenhuma reforma agrária. Deu-se excessivo peso à máquina estatal e negligenciou-se a indústria pesada.

No início da década de 1950, a queda dos preços dos produtos agropecuários no mercado internacional, a inflação e o conflito com os opositores e a igreja (entre outras coisas, por abolir a obrigatoriedade do ensino religioso) fizeram com que Perón, apesar de reeleito (1951), começasse a perder terreno. Em 1952 morreu Evita, o peronismo se fez mais autoritário e foi vencido por um golpe militar. Em novembro de 1955, o general Pedro Eugenio Aramburu restabeleceu a constitucionalidade e três anos mais tarde a população elegeu, com o apoio dos peronistas, o radical Arturo Frondizi, que logo abandonou as promessas de campanha em favor das instruções do Fundo Monetário Internacional (FMI): desvalorização da moeda, restrições ao crédito, privatização de estatais, abertura ao capital estrangeiro e contenção salarial.

Os anos seguintes são de agravamento da crise econômica. Há outro golpe militar (1962), seguido de eleições em 1963, convocadas pelo general Juan Carlos Onganía — que excluiu os candidatos peronistas. Foi eleito Arturo Illia, derrubado logo depois, em 1966, pelo mesmo Onganía. Este encontrou forte contestação social, inclusive o cordobazo, movimento estudantil e operário contra o governo, ocorrido em Córdoba. Com o assassínio de Aramburu pelos Montoneros, extrema-esquerda da juventude peronista, mais dois militares revezaram-se no poder, o segundo dos quais, Alejandro Agustín Lanusse, decidido a organizar eleições gerais e democráticas. Em 1972, saindo do exílio na Espanha para visitar o país, Perón foi aclamado nas ruas e fundou a Frente Justicialista de Liberación (Frejuli).

Os problemas não se resolveram, antes se agravaram: elegeu-se, em 1973, o peronista Héctor Cámpora, que cedeu o lugar à eleição de Perón e sua mulher Maria Estela, conhecida como Isabelita Martínez, para presidente e vice-presidente da república. Em 1974 morreu Perón, Isabelita assumiu o governo com a economia em crise, atentados terroristas e dificuldades de todo tipo. Os militares não tardaram em voltar à cena política, desta vez com um Processo de Reorganização Social implementado por uma junta presidida, sucessivamente, por Jorge Rafael Videla (1976), Eduardo Viola (1981) e Leopoldo Galtieri (fim de 1981 e meados de 1982).

Galtieri protagonizou o episódio das ilhas Malvinas (para os ingleses, Falkland Islands): mandou as forças armadas ocupá-las, entrou em guerra com a Grã-Bretanha e saiu derrotado, com pelo menos 800 perdas humanas. Com a queda de Galtieri e intensa campanha da opinião pública (inclusive a das mães de desaparecidos, na praça de Mayo, dois anos antes), voltou-se a questionar a repressão da ditadura militar que desmoronava, suas perseguições, torturas, assassínios — em torno de 15.000 pessoas desaparecidas. Depois da rápida passagem pelo governo do general Reynaldo Bignone, a Unión Cívica Radical elegeu Raúl Alfonsín, que conduziu o processo penal contra os ex-governantes militares, condenados e presos.

Alfonsín, no entanto, não conseguiu conter a inflação, que chegou a mil por cento ao ano em 1985. O governo lançou então um plano econômico de emergência, denominado Austral (nome da moeda que substituiu o peso). Com a inflação novamente descontrolada, nas eleições de 1989 a União Cívica Radical foi derrotada pelos peronistas. O novo presidente, Carlos Saúl Menem, tomou posse em julho daquele ano e desde logo promoveu cortes nos gastos públicos e iniciou um programa de privatização de empresas estatais. Essa política de estabilização teve a oposição dos sindicatos e foi prejudicada pelo contínuo aumento da inflação. Entretanto, em 1991 as medidas tomadas pelo ministro da Economia, Domingo Cavallo, começaram a dar resultados positivos e a lº de janeiro de 1992 o austral foi substituído pelo novo peso. A estabilização econômica propiciou a reeleição de Menem em 1995.

Sociedade

A organização social argentina distingue-se por uma característica muito particular no panorama latino-americano: compõe-se predominantemente de uma classe média europeizada, com mais de noventa por cento de católicos, padrão de vida e qualificação profissional em progresso e um eficiente sistema previdenciário e de saúde.

O espanhol é o idioma oficial do país, mas sobrevivem algumas línguas e dialetos indígenas. Como ocorreu em tantos outros países hispano-americanos, o espanhol adquiriu, na Argentina, aspectos bastante particulares. Provavelmente por influência do italiano, aparenta maior flexibilidade e fluidez do que nas outras terras de colonização espanhola. A língua indígena mais importante é o guarani, falado na região da Mesopotâmia. Destacam-se ainda o diaguita e dialetos araucanos. Em Buenos Aires, o vocabulário popular incorporou palavras de origem italiana, termos de gíria ligados às corridas de cavalos e ao tango e um sotaque rural, dando origem ao lunfardo, que desfruta de grande autonomia em relação ao espanhol.

Na passagem da década de 1980 para a de 1990, a população argentina, apesar das sucessivas crises econômicas e político-administrativas, manteve uma taxa de mortalidade infantil significativamente baixa para os padrões ainda encontrados na América do Sul, sendo também superiores aos desses outros países seus índices de expectativa de vida e de consumo de calorias e proteínas per capita. Buenos Aires continua sendo a capital e o eixo econômico do país, mas em 1987 o Congresso Nacional aprovou uma proposta do executivo para mudança da capital para Viedma-Carmen de Patagones.

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