Matemática

Trigonometria

O problema da “resolução de triângulos”, que consiste em determinar os seis elementos de um triângulo (3 lados e 3 ângulos) quando se conhece 3 deles, motivou, há mais de dois mil anos, o desenvolvimento da Trigonometria (do grego: trígono= triângulo e métron=medida).

História da Trigonometria

O Problema da Navegação

Na antiguidade, o transporte e a comunicação por via terrestre envolviam enormes dificuldades, pois as vias de acesso entre as localidades eram penosamente construídas, em geral, usando mão de obra escrava. Para percorrer grandes distâncias, era bem mais fácil, portanto, estabelecer rotas marítimas que costeassem ilhas e continentes. A partir da necessidade de se navegar em alto mar, surgiu o problema básico da navegação: o de se determinar a posição de um navio em alto mar.

Os navegantes gregos, que por volta do século V A.C. já tinham absorvido boa parte dos conhecimentos astronômicos dos babilônios, foram os primeiros a formular o conceito de latitude.

Para os navegantes no hemisfério norte, a latitude de um lugar é o ângulo formado pela Estrela Polar e o horizonte, naquele ponto. A latitude de uma pessoa no Polo Norte é de 90º, pois, nesse ponto, a Estrela Polar está diretamente sobre a sua cabeça (na realidade, existe um pequeno desvio angular, pois a Estrela Polar não se encontra exatamente sobre o Polo Norte). Navegando para o norte, a cada noite, um observador veria essa estrela colocar-se cada vez mais alto no céu. Navegando para o sul, aconteceria o contrário. Medindo a elevação angular da Estrela Polar, um marinheiro poderia obter uma medida acurada da distância para o sul ou para o norte.

No Hemisfério Sul, a determinação da latitude de um lugar pode ser feita, da mesma maneira, medindo-se a elevação angular da estrela chamada Sigma Oitante, que representa o Distrito Federal na Bandeira Brasileira.

No entanto, para determinarmos a posição de um ponto no globo terrestre é necessário, além da latitude, que determina a posição Norte-Sul desse ponto, a determinação da sua longitude, que indica a direção Leste-Oeste.

Os Alexandrinos sabiam que um navegador poderia medir a longitude, transportando a bordo de seu navio um relógio preciso. O relógio, acertado para a hora local de Alexandria, indicaria ao navegador a hora naquela cidade, durante toda a sua viagem. Como a Terra descreve uma rotação completa (360º) em 24h, gira 15º, a cada hora. Assim, o navegador poderia determinar sua longitude em qualquer lugar do planeta, simplesmente pela leitura das horas do relógio, quando o sol incidisse diretamente sobre a sua cabeça. Sua longitude em relação a Alexandria seria o produto de 15ºpela diferença, em horas, entre o meio dia e o tempo local de Alexandria, fornecido pelo relógio.

Infelizmente, não havia relógios portáteis, à disposição dos alexandrinos, que fossem suficientemente precisos para manter um registro contínuo das horas, durante uma longa viagem. As dificuldades práticas para a determinação da longitute eram tão grandes, que este dado deixou de ser levado em consideração na prática da navegação, durante um grande período.

As primeiras Noções de Trigonometria

Tentando resolver o problema da navegação, os gregos se interessaram também, em determinar o raio da Terra e a distância da Terra à Lua. Este último problema implicou no surgimento das primeiras noções de Trigonometria.

O primeiro cálculo da circunferência da Terra foi realizado por Eratóstenes (250 A.C.), o bibliotecário de Alexandria. Seus cálculos dependiam do ângulo formado pela sombra do sol e pela vertical em dois pontos: um ao norte e outro ao sul.

Eratóstenes sabia que Alexandria, ponto A na figura abaixo, ficava a 800 km da cidade hoje chamada de Assuã, ponto B e, portanto, esta era a medida do arco AB na figura. Ele também sabia que em 21 de junho, solistício de verão no hemisfério Norte, ao meio dia em Assuã, o sol incidia diretamente sobre as suas cabeças, junto a primeira catarata do Nilo. Portanto, seus raios formavam um ângulo de zero grau com a vertical, não produzindo sombra. No mesmo instante, os raios do sol formavam um ângulo de 71/2 graus com a vertical, em Alexandria.

Devido a grande distância do sol, ao atingirem a Terra, os raios do sol poderiam ser considerarados paralelos e, portanto, os ângulos AÔB e DÂS são iguais, conforme mostra a figura abaixo:

Como o ângulo formado no centro da Terra pelas linhas que partiam de Assuã e de Alexandria, era igual a 7/12  graus, calcular o raio da Terra era equivalente a resolver a seguinte proporção, uma vez que a circunferência inteira da Terra mede360º.

O cálculo, feito por Eratóstenes, para a circunferência da Terra – 38400 km – foi um resultado fantástico se considerarmos que, muito tempo depois, na época de Colombo, os mais reputados geógrafos acreditavam que o valor correto para a circunferência da Terra era cerca de 27200 km. De fato, se Colombo conhecesse uma estimativa melhor (cerca de 39840 km), talvez nunca tivesse se arriscado a viajar para a Índia!

O raio da Terra pode ser estimado dividindo-se o comprimento da sua circunferência por (aproximadamente igual a 6,28 ).

Hiparco adotava para o raio da Terra o valor de 8 800 km (o raio terrestre mede cerca de 6378 km). De posse desse valor, Hiparco tentou achar a distância da Terra à Lua da maneira descrita a seguir.

Suponhamos que a Lua seja observada de dois pontos C e E, conforme mostra a figura abaixo:

Quando estiver diretamente sobre o ponto E, um observador em C vê a Lua nascer no horizonte. Conhecendo a localização dos pontos C e E, Hiparco estimou a medida do ângulo Â. Como a distância AC é igual ao raio da Terra, o problema de Hiparco era o seguinte: conhecidos um dos lados (8 800 km) de um triângulo retângulo e um de seus ângulos (Â), determinar a hipotenusa AB.

Tal problema pode ser resolvido se observarmos que em triângulos retângulos semelhantes as razões, constantes, entre as medidas dos seus lados podem ser associadas aos seus ângulos. Estas razões são chamadas razões trigonométricas. Hiparco organizou diversas tabelas relacionando razões trigonométricas com ângulos.

As relações trigonométricas num triângulo retângulo, que estudaremos a seguir, constituíram um avanço no estudo das relações métricas nos triângulos porque estas, estabelecem fórmulas que relacionam entre si, medidas de segmentos, enquanto que as razões trigonométricas relacionam medidas de ângulos com medidas de segmentos (lados dos triângulos).

Razões Trigonométricas

A ideia central da Trigonometria, como já vimos, é associar a cada ângulo de um triângulo retângulo, certos números, ditos cosseno de () e seno de ( sen ), cuja definição é baseada na semelhança de triângulos.

[Maple Plot]

No desenho acima os triângulos , , são semelhantes (por quê?) e portanto valem as relações:

Agora se definirmos:

as relações (1) e (2) garantem que as definições acima não dependem do particular triângulo retângulo usado para defini-las.

Pelo Teorema de Pitágoras conclui-se imediatamente, que

(5) 

A função de Euler

Com o surgimento e o desenvolvimento do Cálculo Diferencial e Integral foi necessário considerar, em aplicações físicas importantes, as funções seno, cosseno e as outras funções trigonométricas correlatas, definidas para todo número real t .

A transição da definição de seno e cosseno de um ângulo para a definição de seno e cosseno de um número real é feita por meio de uma função E, dita função de Euler, que definiremos a seguir.

O círculo trigonométrico unitário é, por definição, a circunferência de centro na origem e raio 1, orientada no sentido anti-horário. A função de Euler é definida no conjunto dos números reais e sua imagem é o círculo unitário . Isto é, a cada número real t, a função E faz corresponder um ponto E(t) do círculo unitário da seguinte maneira: dado um número real t > 0, medimos em , a partir do ponto (1,0), um arco de comprimento t, sempre percorrendo o círculo no sentido positivo (anti-horário). A extremidade final deste arco é um ponto ( x, y ) de , que definiremos como E(t). Para – , E(-t) será a extremidade final de um arco de comprimento t, medido a partir de (1,0), no sentido negativo de ( isto é no sentido horário ). Veja os gráficos abaixo.

Uma propriedade importante da função é a sua periodicidade.

Dizemos que uma função é periódica de período T, quando , para todo t.

Como o comprimento de é (por quê?), quando t > ou para descrevermos um arco de comprimento t, a partir do ponto (1,0), teremos que dar mais de uma volta ao longo de . Observe a animação abaixo:

[Maple Plot]

Em particular, quando k é um inteiro, as extremidades finais dos arcos de comprimento sempre coincidirão com o ponto (1,0). Isto implica que, qualquer que seja o número real t e o inteiro k, teremos

[Maple Math]

e portanto, a função é periódica de período . É claro que qualquer outro múltiplo inteiro de também é um período para essa função.

As funções periódicas são o instrumento matemático adequado para descrever fenômenos periódicos (movimento planetário, vibração de cordas e membranas, oscilações de um pêndulo, etc.).

A partir da função podemos obter funções com qualquer período, como mostra o exercício abaixo.

As funções seno e cosseno

A função E(t) associa a cada número real t, um ponto ( x,y ) do círculo unitário , isto é , onde . Definimos como sendo a abcissa do ponto e como a sua ordenada, ou seja:

[Maple Math]

como mostrado na figura abaixo:

Todas as propriedades das funções seno e cosseno decorrem dessa definição.

  • Como se define a medida de um ângulo em radianos?
  • Em que caso a medida de um ângulo em radianos coincide com o comprimento do arco do círculo do qual este ângulo é um ângulo central?
  • Quanto mede um ângulo reto em radianos?

A definição da medida de um ângulo em radianos permite estabelecer a conexão entre seno e cosseno de um número real e de seno e cosseno de um ângulo. Assim, quando o número real t está entre 0 e , então e , onde é o ângulo cuja medida, em radianos, é t .

As funções seno e cosseno adquiriram uma importância especial na matemática, a partir do século passado, quando o matemático francês Joseph Fourier, estudando o fenômeno da transmissão do calor, mostrou que qualquer função, sob determinadas hipóteses razoáveis, pode ser obtida como o limite de uma série cujos termos são senos e/ou cossenos. Este fato fundamentou o desenvolvimento de um ramo da matemática, hoje chamado Análise Harmônica.

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