Sociologia

PCC: A alternativa

A poucos anos atrás o Brasil presenciou, pelos canais de comunicação, uma das maiores rebeliões de presos dos presídios do sul e sudeste do país. O estado que mais sofreu foi São Paulo, onde por uma semana, a capital parecia estar sitiada. Terror e medo contagiava a população como uma epidemia. Os seguidos ataques aos policiais, alguns com mortes, colocava todos em questionamento: se nem os policiais estão conseguindo se proteger, o que dizer da população?

Todos estes acontecimentos, ou pelo menos, grande parte deles, teve um núcleo de desenvolvimento e comando, que operava e opera dentro dos próprios presídios. Entre os presos esse comando é chamado de Partido, para as autoridades é um Estado Paralelo, que põe em risco a ordem da sociedade civilizada e organizada. É  o Primeiro Comando da Capital, PCC, tendo como líder-mor Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, o cérebro da organização, considerado um gênio do crime e acusado de arquitetar todas as rebeliões e os ataques feitos às delegacias e policiais.

Feito todo esse resgate dos fatos, é necessário algumas observações sobre o texto, para que não se tenha uma visão distorcida daquilo que o referido trabalho se propõe. Não farei e não faço nenhuma apologia ao PCC, ou qualquer organização criminosa, pois, as vidas inocentes que se foram, ocasionadas pelos ataques, já bastam para ser contrário a qualquer atitude ou feito dessa organição. O que irei propor no texto é o movimento social, a forma que o presidiário vê o Partido, e as atitudes do Estado, que fizeram que organizações como esta, que não são poucas, se desenvolvessem e acabassem como alternativa para aqueles que são postos as margens da sociedade. As análises e questões partirão do Estado de São Paulo, sendo que este é o berço da organização, e o lugar onde ocorreram mais ataques e da onde saíram as ordens para as rebeliões em presídios de todo o país.

O PCC foi criado a cerca de 11 anos, e surgiu como uma organização para proteger o preso, principalmente depois do fático 2 de outubro de 1992, quando no complexo presídiário Carandiru, foram assassinados 111 presos. Assim, o Partido surge para o preso como uma forma de se proteger, tanto do Estado quanto de outros presos, ou de gangues rivais. A revista Caros Amigos lançou este mês a primeira edição especial sobre a história do PCC, e é impressionante como essa facção é organizada, havendo até mesmo Estatuto, onde todos os integrantes devem cumprir sob pena de morte. Além disso, a reportagem traz um dado interessante, a partir da criação do PCC, e de toda sua estruturação, as mortes nos presídios diminuiram significativamente, sendo que, um dos pontos do estatuto proibe os presos de matar outros presos, a não ser que o Partido autorize.

Essa informação, além de ser interessante, é aberta a outras considerações. Mostra como o Estado não protege seu cidadão, e muito menos dá alternativas para ele se ressocializar, muito pelo contrário, depois de cair ou sair da sociedade organizada com toda a sua ordem, é praticamente impossível voltar, assim surge organizações como o PCC que traz alternativas para estas pessoas. Além é claro da lavagem cerebral que é feita, onde torna o preso um fiel fanático, capaz de tudo pela perpetuação do Partido. Assim o Primeiro Comando da Capital surge como movimento que traz uma nova organização social entre os presos, dando a eles proteção, emprego, e muitas vezes ajudas financeiras. Devido a isso que a cada dia, mais jovens das periferias aumentam o contingente da organização, pois são estes que menos têm ajuda e respaldo do Estado, e enxergam no PCC, um futuro que a sociedade organizada não é capaz de oferecer.

Como já disse, o PCC possui 11 anos, o Estado de São Paulo é governado pelo neoliberalismo tucano há 3 governos, na ordem: Franco Montoro, Mario Covas e por último Geraldo Alckmin, sem contar nas prefeituras de Fleury Filho e Jose Serra, combinando ainda com os 8 anos de FHC iniciado em 1994. Fica claro que essa política que valoriza o capitalismo, onde o social é visto como uma pedra no sapato da elite, foi o principal responsável pelo caos social causado pela facção, sendo que isso já vinha sendo anunciado muitos anos antes de acontecer as rebeliões e nada foi feito.

Durante todo esse período, o sistema penitenciário do país foi inchando, as cadeias cada vez mais parecidadas com masmorras de castelos medievais, os presos em condições subhumanas, a população pobre sem nenhuma perspectiva de vida, à mercê de propostas tentadoras do crime organizado, que é fato, aumentou consideravelmente nesses anos. Pergunto: como fica a mentalidade de uma criança que mora na favela, que ao sair de seu barraco, vê na sua frente o alto muro da Daslu, onde as socialites estão gastando 5 mil reais para comprar uma carteira de couro de canguru, enquanto sua mãe pede esmola na rua, não sabe quem é seu pai, e precisa ajudar no sustento da família desde criança. Até que chega um traficante oferecendo muito dinheiro para “simplesmente” levar um pacote até determinado lugar. Qual escolha ele vai fazer? Quem vai dizer pra ele que aquilo é errado? Sua mãe, que dificilmente fica em casa, pois precisa trabalhar 16 horas por dia, para tirar o sustento dos filhos? Sua professora, que sai de casa de madrugada, pega 3 conduções para chegar a escola, que não tem carteiras, livros, giz, e que no final do mês, seu salário mal dá para sobreviver? São esses e tantos outros fatores que tornam o PCC e tantos outros como CV no Rio de Janeiro, uma opção, uma saída de uma vida miserável.

As rebeliões ocorreram, os problemas foram expostos, resta saber o que o Estado vai fazer para que isso não volte a acontecer. Mas, a solução não está somente na construção de modernos presídios ou na reforma do Poder Judiciário para dar solução em processos parados a anos, mas sim em investimentos no social, para que mais jovens não atualizem o crime organizado, e para que isso ocorra precisa ser feito um programa de longo prazo, com a participação de municipio, estado e nação, certamente os frutos colhidos valerão a pena, mas só serão notados em 10 ou 15 anos.

Adilson De Carli
Acadêmico de História

UFMT – Turmas Especiais de Primavera do Leste

Autoria: Adilson de Carli

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