Direito

Sequestro ao Ônibus da Linha 174

Este trabalho trata-se da análise dos aspectos sociológicos e jurídicos que envolveram os fatos apresentados no filme “Ônibus 174“.

O episódio do sequestro ao ônibus demonstrou a insegurança vivenciada pelos cidadãos brasileiros diante da prática da violência desenfreada e da inexistência de um instrumento eficaz para o seu combate.

Análise do filme

O início do drama se deu com a tentativa de assalto, por um jovem, aos passageiros do ônibus. Essa tentativa foi frustrada por policiais que interceptaram o veículo ao tomarem conhecimento do fato por meio de terceiros. Percebendo-se acuado, o assaltante decidiu fazer reféns os passageiros.

Começa, então, um triste espetáculo que se prolongaria por muitas horas e teria como desfecho a trágica morte de uma das passageiras e do próprio assaltante, dentro da viatura policial, durante o trajeto que o levaria até a delegacia.

Analisando as imagens apresentadas no filme, verifica-se a fragilidade do Estado na condução do problema e a influência da mídia nas decisões tomadas pelo Poder Público.

Várias foram as oportunidades em que a força policial poderia ter atuado mais energicamente contra o assaltante, uma vez que, durante todo o tempo, o sequestrador se posicionou de forma vulnerável, possibilitando a ação dos policiais. O comportamento do assaltante nesses momentos levou os espectadores a crerem que seu foco tinha mudado, despertando-lhe a vontade de aproveitar a publicidade alcançada pelo evento para ser reconhecido e notado como indivíduo.

Nessa conjuntura, os representantes da segurança pública tomaram uma decisão política em detrimento à decisão técnica de agir contra o assaltante – certamente temendo a repercussão que a ação teria, tendo em vista a presença maciça da mídia.

A narrativa do filme traz ao conhecimento dos assistentes a vida pregressa do sequestrador, de nome Sandro. Aos seis anos, filho de pai desconhecido, presencia o assassinato da mãe, grávida de cinco meses. Cresce em abandono, morando nas ruas do centro do Rio de Janeiro. Sobrevive ao massacre de meninos de rua da Candelária. Praticava roubos a veículos parados nos sinais de trânsito, para sustentar a si e ao vício em drogas diversas. Ainda menor, foi sentenciado ao cumprimento de medidas sócieducativas, não efetivadas porque fugia das instituições onde permanecia sob custódia.  Já na idade adulta, foi condenado e sentenciado pela prática de furto qualificado e assalto – mais uma vez não cumpriu a pena estabelecida. Apesar de apresentar bom comportamento durante o período em que esteve preso, optou, sem muita convicção, por seguir outros presos que se evadiram da carceragem.

A retrospectiva de vida de Sandro, repleta de infortúnios, encaminhada sem a assistência da família ou do Estado, conduz ao pensamento de Carnelutti (2005), expressado na obra “As misérias do processo Penal”, em que o autor afirma que todos os homens possuem incrustados em si o germe do bem e do mal, e o desenvolvimento de um ou de outro depende, em muito, do tratamento que recebem ao longo da vida. No caso de Sandro, prevaleceu o germe do mal.

Conclusão

Por tudo que foi visto e ouvido durante o filme, percebe-se claramente as falhas do sistema de segurança oferecido pelo Estado, iniciando-se pela ineficácia das medidas preventivas existentes, provavelmente em razão do distanciamento entre a legislação abstrata, que determina o desenvolvimento de políticas efetivas de atendimento às famílias, às crianças e aos adolescentes em situação de risco pessoal e social, e o tratamento dispensado ao fato concreto; passando pelo desaparelhamento das polícias, haja vista a precariedade de recursos material e humano verificada no decorrer das negociações com o sequestrador; e finalizando com a mal sucedida ideia de alcançar-se a ressocialização do delinquente por meio do cumprimento da pena privativa de liberdade em condições tão desumanas que raramente possibilitam ao sentenciado reaver sua condição de cidadão do ponto de vista da sociedade e de si próprio.

BIBLIOGRAFIA

  • ÔNIBUS 174. Direção José Padilha. Rio de Janeiro: Riofilme, 2002. Son. Color. Documentário.
  • CARNELUTTI, Francesco. As misérias do Processo Penal. 6 ed., Campinas: Bookseller, 2005.

Autoria: Marli Rodovalho