Artes

História do Cinema Brasileiro

Ao analisar o surgimento e desenvolvimento das atividades do cinema no Brasil, podemos apontar quatro vertentes principais que sempre estiveram presentes: o registro documental, a imitação, a paródia e a reflexão, que conduz à originalidade artística.

A partir dessas quatro direções, aliado às características e peculiaridades da identidade brasileira, construiu-se um movimento de cinema nacional que retrata o país, representando “o que fomos, o que somos e aquilo que poderíamos ser”.

A diversidade temática e estilística, mais acentuada na fase contemporânea, reflete a pluralidade étnica e cultural brasileira, além da inquietude intelectual, que impele os diretores à busca de novos conceitos e ideias.

A partir dos anos 10, a indústria cinematográfica norte-americana passou a dominar o mercado do país, abafando a produção local, que sempre esteve em desvantagem em relação aos Estados Unidos. Em consequência, o público habituou-se a assistir as produções holywoodianas, fato que dificultou a aceitação de um cinema diferente daquele. E o brasileiro é notoriamente diferente, mesmo quando tenta imitá-lo. Esta diferença representa nossa condição, na qual se inclui o subdesenvolvimento, como é enunciado por Paulo Emílio Salles Gomes. Tal disparidade torna nossos filmes originais e interessantes.

História do Cinema

Início do cinema no Brasil

Em 1896, apenas sete meses depois da histórica exibição dos filmes dos irmãos Lumière em Paris, realiza-se no Rio de Janeiro a primeira sessão de cinema no Brasil. Um ano depois, Paschoal Segreto e José Roberto Cunha Salles inauguram, na rua do Ouvidor, uma sala permanente.

Durante dez anos os anos iniciais, o cinema brasileiro enfrentou grandes problemas para realizar a exibição de fitas estrangeiras e a fabricação artesanal de filmes, devido à precariedade no fornecimento de energia elétrica no Rio de Janeiro. A partir de 1907, com a inauguração da usina hidrelétrica de Ribeirão das Lages, o mercado cinematográfico floresceu. Cerca de uma dezena de salas de exibição são abertas no Rio de Janeiro e em São Paulo, e a comercialização de filmes estrangeiros acompanha uma promissora produção nacional.

Em 1898, Afonso Segreto roda o primeiro filme brasileiro: algumas cenas da baía de Guanabara. Em seguida, são realizados pequenos filmes sobre o cotidiano carioca e filmagens de pontos importantes da cidade, como o Largo do Machado e a Igreja da Candelária, no estilo dos documentários franceses do início do século. Outras exibições e aparelhos de vários tipos, como os animatógraphos, cineógrafos e vitascópios, surgiram em outras cidades, além do Rio, como São Paulo, Salvador, Fortaleza.

O repertório dos filmes exibidos nessa época não se diferenciava do que era apresentado em outros países: cenas rápidas mostrando paisagens, chegadas de trem, cenas circenses, animais, touradas e outros fatos cotidianos. Acompanhavam as exibições nacionais alguns filmes vindos do exterior de diretores como Edison, Méliès, Pathé e Gaumont. Os locais de exibição variavam: barracas de feiras de diversão, salas improvisadas, teatros ou outros locais, como foi o caso de Petrópolis, que teve seu cassino como lugar de exibição.

Os filmes brasileiros e os estrangeiros alimentavam os poucos pontos de exibição. Alguns títulos da produção dessa época, às vezes exibidos apenas num único local, são: “Procissão do Corpo de Deus”, “Rua Direita”, “Sociedade Paulista de Agricultura”, “Avenida Central da Capital Federal”, “Ascensão ao Pão de Açúcar”, “Bombeiros” e “Chegada do General”.

Uma característica observada nesse período é o predomínio de imigrantes, principalmente italianos, dominando as ferramentas técnicas e interpretativas, sendo responsáveis pelas primeiras produções. A participação de brasileiros efetivou-se com a representação de temas simples, cotidianos, obras teatrais leves e revistas.

Outra característica da época é o controle por parte dos empresários de todos os processos da indústria de cinematográfica, como produção, distribuição e exibição, prática que foi abolida por regulamentação algum tempo depois. Após 1905, é observado um certo desenvolvimento das apresentações, estimulando a concorrência entre os exibidores, e proporcionando o aprimoramento de algumas técnicas novas nos filmes, como temáticas e formas de exibição. Algumas inovações são o aparecimento de filmes sincronizados com o fonógrafo e de filmes falantes, com a introdução de atores falando e cantando atrás das telas, realizadas por exibidores como Cristóvão Auler e Francisco Serrador. Este último, imigrante espanhol, antes exibidor itinerante, e que já havia instalado a sua primeira sala fixa em São Paulo em 1907, passa a produzir com Alberto Botelho outra novidade, os cine-jornais.

A partir de então começam a surgir produtores e exibidores com respaldo de grupos capitalistas, como aconteceu com Auler, que funda o Cine Teatro Rio Branco. É o momento do primeiro desenvolvimento das salas de exibição no Brasil, para criar uma demanda mais regular de produtos cinematográficos. Nessa ocasião o cinema europeu e americano tornou-se industrialmente e comercialmente mais sólidos, passando a disputar mercados externos. Os franceses predominavam até então com as empresas Gaumont e Pathé.

Esta última interrompeu por volta de 1907 a venda de filmes para o Brasil, abrindo espaço para o truste formado por Edison nos Estados Unidos. Essa modificação no mercado cinematográfico brasileiro, que causou uma certa descontinuidade na importação, é considerada fator responsável para um primeiro surto produtivo brasileiro, que ficou conhecido como a “bela época do cinema no Brasil”.

A bela Época

Os anos compreendidos entre 1908 e 1911 ficaram conhecidos como a idade de ouro do cinema nacional. No Rio de Janeiro, formou-se um centro de produção de curtas, que além da ficção policial, desenvolveu vários gêneros: melodramas tradicionais (“A cabana do Pai Tomás”), dramas históricos (“A república portuguesa”), patrióticos (“A vida do barão do Rio Branco”), religiosos (“Os milagres de Nossa Senhora da Penha”), carnavalescos (“Pela vitória dos clubes”) e comédias (“Pega na chaleira” e “As aventuras de Zé Caipora”). A maior parte é realizada por Antônio Leal e José Labanca, na Photo Cinematographia Brasileira.

Em 1908 são realizados no Brasil os primeiros filmes de ficção, uma série considerável com mais de trinta pequenos filmes. A maioria baseada em trechos de óperas, criando a moda do cinema falante ou cantante com intérpretes atrás da tela, outros engenhos sonoros, o que fosse possível.

Cristóvão Auler se dedicou à produção de filmes baseados em óperas, como “Barcarola”, “La Bohème”, “O Guarani” e “Herodíade”. O cineasta Segreto, seguindo a tendência dos filmes estrangeiros cômicos que faziam sucesso na época, procurou enveredar para os “filmes alegres”, produzindo obras como “Beijos de Amor” e “Um Colegial numa Pensão”. Alguns procuravam a originalidade no repertório brasileiro, como o “Nhô Anastácio Chegou de Viagem”, uma comédia produzida por Arnaldo & Companhia e fotografada por Júlio Ferrez.

Outra vertente que prosseguiu com sucesso no cinema mudo brasileiro foi o gênero policial. Em 1908 foram produzidos “O Crime da Mala” e “A Mala Sinistra”, ambos com duas versões neste mesmo ano, e ainda “Os Estranguladores”.

“O Crime da Mala (II)”, produzido pela empresa F. Serrador, reconstituía o assassinato de Elias Farhat por Miguel Traad, que esquartejou a vítima e tomou um navio com a intenção de jogar o cadáver ao mar, mas acabou preso. O filme apresenta cenas documentais do julgamento de Traad acrescidas de registros autênticos dos locais do crime. A união de imagens encenadas com cenas documentais demonstra um impulso criativo incomum, representando os primeiros voos formais criativos da história do cinema no Brasil.

“Os Estranguladores”, de Antônio Leal, produzido pela Photo-Cinematografia Brasileira, era uma adaptação de uma peça teatral contendo uma intricada história de dois assassinatos. A obra é considerada o primeiro filme de ficção brasileiro, tendo sido exibido mais de 800 vezes. Com cerca de 40 minutos de projeção, há indícios de que este filme tinha uma duração excepcional em relação ao que se fazia na ocasião. Essa temática passa a ser exaustivamente explorada nas produções do período, sendo assim outros crimes da época são reconstituídos, como “Noivado de sangue”, “Um drama na Tijuca” e “A mala sinistra”.

Os filmes cantantes prosseguiam na moda e foram realizados alguns que marcaram a época, como “A Viúva Alegre”, de 1909, que aproximava os atores da câmera, operação pouco usual. Fugindo da temática operística para adotar gêneros nacionais, foi realizada a revista musical satírica “Paz e Amor”, que se tornou um êxito financeiro sem precedentes.

A partir desta época começaram a surgir atores para o cinema, alguns provenientes do teatro como Adelaide Coutinho, Abigail Maia, Aurélia Delorme e João de Deus.

Torna-se difícil definir com exatidão a autoria dos filmes nos primórdios do cinema, quando as funções técnicas e artísticas ainda não tinham sido convencionadas. Confundia-se o papel do produtor, roteirista, diretor, fotógrafo ou cenógrafo. Às vezes apenas uma pessoa assumia todas essas funções ou as dividia com outros. Para complicar, com frequência a figura do produtor confundia-se com o exibidor, fato este que favoreceu esse primeiro surto do cinema no Brasil.

Apesar disso é oportuno salientar algumas figuras que se mostraram básicas para a realização dos filmes, sem estabelecermos qual o grau de contribuição autoral que estas deram aos mesmos. Além daqueles já referidos, podemos lembrar de Francisco Marzuello, intérprete e diretor teatral que participou como ator em vários filmes, foi o diretor de cena de “Os Estranguladores”, fazendo parceria com Giuseppe Labanca, produtor do mesmo filme; Alberto Botelho fotografou “O Crime da Mala”; Antônio Leal produziu e fotografou “A Mala Sinistra I”; Marc Ferrez produziu e Júlio Ferrez foi operador de “A Mala Sinistra II”; ainda vale lembrar, Emílio Silva, Antônio Serra, João Barbosa e Eduardo Leite.

Os filmes representavam um pouco de tudo, uma verdadeira tentativa de equiparação com o que vinha de fora, acrescida da vontade de também revelar o que tínhamos por aqui. O fato é que o cinema brasileiro começava a se estruturar, caminhava, experimentava e marcava sua capacidade inventiva, e com algumas obras marcantes encantava o público e gerava receita.

Declínio

Essa produção variada sofre uma redução significativa nos anos seguintes, por causa da concorrência estrangeira. Em decorrência disso, muitos profissionais da área cinematográfica migraram para atividades comercialmente mais viáveis. Outros sobreviveram fazendo “cinema de cavação” (documentários sob encomenda).

Dentro desse quadro, há manifestações isoladas: Luiz de Barros (“Perdida”), no Rio de Janeiro, José Medina (“Exemplo regenerador”), em São Paulo, e Francisco Santos (“O crime dos banhados”), em Pelotas, RS.

A crise gerada pelo desinteresse dos exibidores por filmes brasileiros, gerando um distanciamento entre a produção e a exibição em 1912, não foi uma questão superficial nem momentânea. Os circuitos de exibição, que começavam a se formar na época, foram seduzidos por perspectivas de negócios mais lucrativos com produtoras estrangeiras, adotando definitivamente o produto de fora, principalmente o norte-americano. Tal fato colocou o cinema brasileiro na marginalidade por tempo indeterminado.

A relação entre os exibidores e o cinema estrangeiro estabeleceu um caminho sem volta, pois se transformou num processo de desenvolvimento comercial de tal magnitude, controlado pelas empresas de distribuição norte-americana, que até hoje o nosso cinema se mantém preso a uma situação anômala de comercialização.

A partir disso, a produção de filmes brasileiros passou a ser ínfima. Até os anos 20, a quantidade de filmes ficcionais ficou numa média de seis filmes anuais, às vezes com apenas dois ou três ao ano, sendo que uma boa parte destes era de curta duração.

Com o fim da fase de produção regular de filmes, quem fazia cinema foi procurar trabalho na área documental, produzindo documentários, revistas e jornais de cinema, única área cinematográfica em que havia demanda. Este tipo de atividade permitiu certa continuidade ao cinema no Brasil.

Cineastas veteranos, como Antônio Leal e os irmãos Botelho, passaram a trabalhar nesse campo, só conseguindo realizar filmes de enredo esporadicamente, com investimentos particulares. Foi o caso de “O Crime de Paula Matos”, de 1913, um filme longo, com duração de 40 minutos, que seguia o bem sucedido estilo policial.

Período de guerra

Apesar de estar marginalizada, a atividade cinematográfica sobreviveu. Após o ano de 1914, o cinema foi retomado, devido ao início da Primeira Guerra Mundial e consequente interrupção da produção estrangeira. No Rio e em São Paulo novas firmas produtoras foram criadas.

A partir de 1915 é produzido um grande número de fitas inspiradas na literatura brasileira, como “Inocência”, “A Moreninha”, “O Guarani” e “Iracema”. O italiano Vittorio Capellaro é o cineasta que mais se dedica a essa temática.

Entre os anos de 1915 e 1918, Antônio Leal desenvolveu intenso trabalho, como por exemplo, a produção, direção e fotografia de “A Moreninha”; construiu um estúdio de vidro onde produziu e fotografou “Lucíola”; e produziu “Pátria e Bandeira”. No bem sucedido filme “Lucíola” lançou a atriz Aurora Fúlgida, que foi muito elogiada pela primeira geração de espectadores e comentaristas.
Embora a produção nacional tenha crescido notoriamente no período da guerra, após 1917 mergulha novamente numa fase de crise, desta vez motivada pela restrição dos filmes nacionais às salas de exibição. Essa segunda época do cinema no Brasil não obteve o mesmo sucesso que a primeira, pois era incipiente a realização de filmes de enredo.

Nesse período, um fenômeno que começou a dar mais vida ao cinema brasileiro foi a sua regionalização. Em alguns casos, com o próprio dono do cinema produzindo os filmes, formando assim a conjunção de interesses entre produção e exibição, seguindo o mesmo caminho que já havia certo no Rio de Janeiro e São Paulo.

Ciclos Regionais

Em 1923, a atividade cinematográfica que se limitava ao Rio de Janeiro e São Paulo estendeu-se a outros focos de criação: Campinas (SP), Pernambuco, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. A regionalização das atividades cinematográficas levou os estudiosos de cinema a classificar cada movimento isolado como um ciclo. A origem de cada ciclo foi circunstancial e independente, além disso, cada manifestação apresentava um perfil próprio. Em vários lugares, a iniciativa de realizar filmes foi tomada por pequenos artesãos e jovens técnicos.

O regionalismo é definido na historiografia cinematográfica brasileira com alguma desigualdade. Em princípio trata-se da produção de filmes de ficção em cidades fora do eixo Rio/São Paulo, no período do cinema mudo. No entanto, alguns estudiosos têm usado o termo para cidades que tiveram uma produção de documentários intensa ou iniciativa pequenas, porém relevantes.

Surgiram nesse tempo os clássicos do cinema mudo brasileiro, formato que quando conquistou sua plenitude no país estava defasado, pois o cinema falado já fazia sucesso no mundo inteiro.

É considerada a terceira fase do cinema de enredo, no qual foram realizados 120 filmes, o dobro da época anterior. Surgem as ideias e o cinema brasileiro começa a ser discutido. Também começam a surgir com maior relevo as estrelas e os astros. Publicações específicas como as revistas Cinearte, Selecta e Paratodos passaram a desenvolver um canal de informações voltado ao público sobre o cinema brasileiro, revelando claro interesse pela produção do país.

Grande parte das obras do cinema muda era baseada na literatura brasileira, levando para as telas autores como Taunay, Olavo Bilac, Macedo, Bernardo Guimarães, Aluísio Azevedo e José de Alencar. Uma curiosidade é que o cineasta italiano Vittorio Capellaro foi o maior entusiasta dessa tendência. Esse fato não é de se estranhar, pois a participação dos imigrantes europeus no movimento cinematográfico era expressiva.

Capellaro, com experiência em cinema e teatro, desenvolveu seu trabalho em São Paulo. Com o parceiro Antônio Campos, produziu em 1915 uma adaptação do romance de Taunay, “Inocência”. O imigrante realizou também documentários e filmes de ficção, principalmente baseados em temas brasileiros: “O Guarani” (1916), “O Cruzeiro do Sul” (1917), “Iracema” (1919) e “O Garimpeiro” (1920).

Os imigrantes tinham facilidade em entrar para o ramo fotográfico e cinematográfico, pois possuíam habilidade no uso de aparelhos mecânicos e às vezes alguma experiência no cinema. Durante a Primeira Guerra, 12 produtoras estabeleceram-se no Rio de Janeiro e São Paulo, a maior parte criada por imigrantes, principalmente italianos, e algumas por brasileiros. Uma destas é a Guanabara, de Luís de Barros, cineasta que realizou a mais longa carreira do cinema no Brasil.

Barros realizou de 1915 à 1930 cerca de 20 filmes, como “Perdida”, “Vivo ou Morto”, “Zero Treze”, “Alma Sertaneja”, “Ubirajara”, “Coração de Gaúcho” e “Joia Maldita”. Com o tempo, adquiriu experiência em filmes baratos e populares, dos mais diversos gêneros, sobretudo da comédia musical. Lançou o primeiro filme nacional inteiramente sonorizado, “Acabaram-se os otários”.

No Rio de Janeiro, em 1930, Mário Peixoto realiza o vanguardista “Limite”, influenciado pelo cinema europeu. Em São Paulo, José Medina é a figura de destaque no cinema paulista dessa época. Com Gilberto Rossi, realizou “Exemplo Regenerador”, com a direção de Medina e a fotografia de Rossi, um pequeno filme para demonstrar a continuidade cinematográfica tal qual os americanos a vinham praticando no “filme posado”. Em 1929, Medina dirige o longa “Fragmentos da vida”.

Em Barbacena, Minas Gerais, Paulo Benedetti instalou o primeiro cinema local e realizou alguns documentários. Inventou o Cinemetrófono, que possibilitou um bom sincronismo do som do gramofone com as imagens da tela, e criou a produtora Ópera Filme, em parceria com empresários locais, para realizar filmes cantados. Fez alguns pequenos filmes experimentais, depois encenou um trecho da ópera “O Guarani” e “Um Transformista Original”, que utilizava trucagens cinematográficas tipo Méliès. Ao perder o apoio dos investidores, foi para o Rio de Janeiro onde prosseguiu suas atividades.

Na cidade mineira de Cataguases, o fotógrafo italiano Pedro Comello inicia experiências cinematográficas com o jovem Humberto Mauro e produzem “Os três irmãos” (1925) e “Na primavera da vida” (1926). Em Campinas, SP, Amilar Alves ganha prestígio com o drama regional “João da Mata” (1923).

O ciclo pernambucano, com Edson Chagas e Gentil Roiz, é o que mais produz. No total foram realizados 13 filmes e vários documentários, entre os anos de 1922 e 1931. O destaque foi Edson Chagas, que em parceria com Gentil Roiz, fundou a Aurora Filmes, que com recursos próprios produziram “Retribuição” e “Jurando vingar”, aventuras que contam com personagens semelhantes à caubóis. Os temas regionais aparecem com os jangadeiros de “Aitaré da praia”, com os coronéis de “Reveses” e “Sangue de irmão”, ou com o cangaceiro de “Filho sem mãe”. Ainda no ciclo de Recife, foi fundamental para as atividades a inauguração do cine Royal, devido ao proprietário, Joaquim Matos, que sempre garantiu destaque às exibições dos filmes locais, ao proporcionar grandes festas com banda de música, rua iluminada, fachada coberta de flores e bandeiras e até folhas de canela colocadas no chão da sala.

O movimento gaúcho, de menor expressão, destaca “Amor que redime” (1928), um melodrama urbano, moralista e sentimental, de Eduardo Abelim e Eugênio Kerrigan. No interior do Estado, o português Francisco Santos, que já havia trabalhado com cinema em seu país de origem, abriu cinemas em Bagé e Pelotas, onde constituiu a produtora Guarany Film. “Os Óculos do Vovô”, 1913, de sua autoria, é uma comédia cujos fragmentos são hoje os mais antigos dos filmes ficcionais brasileiros preservados.

Com a participação do Brasil na Primeira Guerra, muitos de filmes patrióticos foram realizados, que soavam um tanto ingênuos. No Rio foi realizado “Pátria e Bandeira”, sobre a espionagem alemã no país, e em São Paulo “Pátria Brasileira”, do qual participaram o exército e o escritor Olavo Bilac. Lançado com título em francês, o filme “Le Film du Diable”, sobre uma invasão alemã na Bélgica, trazia cenas de nudez. Também nessa temática, foram lançados “O Castigo do Kaiser”, o primeiro desenho animado brasileiro, “O Kaiser”, e os cívicos “Tiradentes” e “O Grito do Ipiranga”.

Na década de 20 também surgiram filmes com temas ousados, tais como “Depravação”, de Luís de Barros, com cenas apelativas, mas que alcançou grande sucesso de bilheteria. “Vício e Beleza”, dirigido por Antônio Tibiriçá, tratava das drogas, assim como “Morfina”. A crítica da época não aprovou tais filmes: a revista Fan, em seu primeiro número, sentenciava “Morfina é morfina para o cinema nacional”.

Entretanto, outros gêneros despontaram nessa época, como por exemplo, o policial. Em 1919, Irineu Marinho fez “Os Mistérios do Rio de Janeiro”, e em 1920, Arturo Carrari e Gilberto Rossi realizaram “O Crime de Cravinhos”. Surgiram também “O Furto dos 500 Milhões”, “A Quadrilha do Esqueleto” e, mais tarde, “O Mistério do Dominó Negro”.

Também foram lançadas produções de cunho religioso, entre os quais “Os Milagres de Nossa Senhora da Aparecida”, em 1916, e “As Rosas de Nossa Senhora”, de 1930.

Em algumas localidades, principalmente em Curitiba, João Pessoa e Manaus, surgiram importantes produções na área documental. Durante os anos 20, em Curitiba surgem obras como “Pátria Redimida”, de João Batista Groff, que mostra o trajeto das tropas revolucionárias de 1930. Além de Groff, outro expoente local é Arthur Rogge. Em João Pessoa, Walfredo Rodrigues realizou uma série de documentários curtos, além de dois longos: “O Carnaval Paraibano” e “Pernambucano”, e “Sob o Céu Nordestino”. Já em Manaus, Silvino Santos produziu obras pioneiras, que se perderam em função das dificuldades do empreendimento.

Os movimentos regionais eram manifestações frágeis, que geralmente não se mantinham financeiramente, principalmente por causa da pequena área de exibição das produções, restrita às suas próprias regiões. Na verdade, os ciclos regionais tornaram-se inviáveis com o aumento dos custos de produção, em decorrência das complexas novas técnicas de som e imagem. Depois de um certo tempo, as atividades cinematográficas voltaram a concentrar-se no eixo Rio/São Paulo.

Cinédia

A partir de 1930, a infra-estrutura para a produção de filmes no país se sofistica com a instalação do primeiro estúdio cinematográfico, o da companhia Cinédia, no Rio de Janeiro. Adhemar Gonzaga, jornalista que escrevia para a revista Cinearte, idealiza a produtora Cinédia, que passou a se dedicar à produção de dramas populares e comédias musicais, que ficaram conhecidas pela denominação genérica de chanchadas. Encontrou várias dificuldades para realizar as primeiras produções, até que conseguiu finalizar “Lábios Sem Beijos”, dirigido por Humberto Mauro. Em 1933 Mauro dirige com Adhemar Gonzaga “A voz do carnaval”, com a cantora Carmen Miranda. “Mulher”, de Otávio Gabus Mendes e “Ganga Bruta”, também de Mauro, foram as próximas obras dessa companhia. A Cinédia também é responsável pelo lançamento de Oscarito e Grande Otelo, em comédias musicais como “Alô, alô, Brasil”, “Alô, alô, Carnaval” e “Onde estás, felicidade?”.

Um filme atípico da filmografia brasileira, por ser uma obra cujo sentido plástico e rítmico predominam, foi ” Limite”, projeto que inicialmente foi recusado pela empresa. No entanto, o projeto é levado a diante por Mário Peixoto, com Edgar Brasil na direção de fotografia. É uma produção modernista que reflete o espírito que reinou na avant-garde francesa de dez anos antes. O ritmo e a plasticidade suplantam a própria história do filme, que se resume na situação de três pessoas perdidas no oceano. São três personagens, um homem e duas mulheres, que vagam num pequeno barco e cada uma delas conta uma passagem de sua vida. O infinito do mar representa seus sentimentos, seus destinos.

O cinema falado

No final dos anos 20, o cinema no Brasil já tinha certo domínio sobre a expressão cinematográfica, inclusive sendo detentor de uma filmografia expressiva. Foi nessa época que a indústria cinematográfica americana impôs ao mundo o cinema falado, causando uma profunda transformação técnica que modificou os métodos de produção dos filmes e sua linguagem. Os estúdios norte-americanos passaram a ditar as novas regras tecnológicas, levando os outros países a seguir esse novo caminho.

Os cineastas brasileiros encontraram obstáculos técnicos e financeiros impostos pela nova tecnologia, como o aumento nos custos da produção, determinado pelas técnicas de sonorização. Além das deficiências próprias do nosso cinema, que não tinha uma infra-estrutura industrial e muito menos comercial, esse novo tipo de cinema se impôs na mesma época que a crise financeira de 1929. Isto representou uma agravante significativa para um cinema que, entre nós, beirava o amadorismo e se baseava em iniciativas quase sempre individuais ou de pequenos grupos de pessoas físicas. O resultado foi a eliminação de quase tudo o que se fazia regionalmente, para deixar o pouco que sobrou concentrado no eixo Rio/São Paulo.

As produções nacionais passaram por um período de transição para se adequar e absorver a nova tecnologia do cinema falado que durou cerca de seis anos, espaço de tempo que diminuiu as possibilidades da afirmação de um cinema nacional, até a adaptação completa ao som. Esse atraso serviu para garantir a afirmação comercial do cinema americano no Brasil, que já contava com excelentes e luxuosas salas de exibição, principalmente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.

Mesmo com o período de assimilação do som, as produções nacionais não conseguiram resultados tecnicamente positivos. Em 1937, Humberto Mauro filmou “O Descobrimento do Brasil” com a predominância da música em detrimento das falas, pela dificuldade da superposição das vozes com a música. Somente na década de 40 a Cinédia conseguiu importar equipamentos mais avançados, possibilitando a mixagem, a mistura de som e voz com dois canais de gravação. Isto se deu com “Pureza”, de Chianca de Garcia.

Ainda assim, durante os anos posteriores, a divisão entre as sequências musicadas e as faladas permaneceu na linguagem comum do cinema brasileiro. Tal situação conservou-se até o surgimento da Companhia Cinematográfica Vera Cruz, no final da década de 40.

O cinema sonoro não teve um marco definido no país, e apresentava diversas técnicas, inclusive a utilização de discos gravados, o que representava coisa de um cinema antigo, mesmo se elaborado com nova tecnologia, a do vitaphone, que é uma sincronização de discos com o projetor de filmes. Quem saiu na frente produzindo filmes sonoros foi o pioneiro Paulo Benedetti, que realizou entre 1927 e 1930 cerca de 50 obras de curta metragem, sempre se valendo de planos fixos e registrando conjuntos musicais.

Em 1929, é realizado em São Paulo “Acabaram-se os Otários” de Luís de Barros, com participação de Benedetti. Alguns historiadores consideram esse o primeiro filme sonoro de longa-metragem brasileiro. Nesse período de adaptação técnica, o fato mais significativo foi a junção do cinema ao teatro de revista, que gerou o filme musical. Wallace Downey, americano que atuava no país, resolveu produzir e dirigir um filme, seguindo o modelo hollywoodiano pioneiro do cinema falado. Ao usar o sistema vitaphone, Downey realizou o filme “Coisas Nossas”, título do célebre samba de Noel Rosa.

Contudo, o sistema de som que prevaleceu em todo o mundo foi o movietone, em detrimento ao vitaphone, com tecnologia que permitia gravar o som diretamente na película, dispensando discos e equipamentos complementares. O obstáculo que atrasou a assimilação dessa tecnologia foi a recusa norte-americana de comercializá-la no exterior, evitando a venda de equipamentos. A filmagem com esses aparelhos exigiam estúdios com isolamento acústico, o que encarecia qualquer empreendimento. Apenas em 1932 esse sistema chegou ao Brasil através da Cinédia, que produziu o curta-metragem “Como se faz um Jornal Moderno”.

Para isso, Wallace Downey em parceria com a Cinédia, importou equipamento RCA, oferecendo base técnica para a realização dos primeiros filmes cariocas de revistas musicais. Isto aconteceu após Adhemar Gonzaga realizar “A Voz do Carnaval”, de 1933, com a colaboração de Humberto Mauro, reforçando essa direção do cinema ligado à revista musical. Após a parceria, Downey e Gonzaga realizaram os filmes “Alô, Alô Brasil”, “Os Estudantes” e “Alô, Alô, Carnaval”.

“Os Estudantes”, trazia Carmen Miranda apresentando-se pela primeira vez como atriz e não apenas como cantora. Em “Alô, Alô Carnaval”, Oscarito, após ter sua estreia no “A voz do Carnaval”, afirmou-se como artista cômico. Este filme, uma revista musical, alternava músicas e sátiras da época, mostrando Mário Reis cantando música de Noel Rosa, além de Dircinha Batista, Francisco Alves, Almirante e as irmãs Aurora e Carmem Miranda, enfim, o que estava na moda e que hoje se cultua. Porém, após lançar esses filmes, Wallace e a Cinédia separam-se, colocando um ponto final na parceria de sucesso.

Nessa época, existiam quatro empreendimentos cinematográficos que buscavam trabalhar o cinema falado: Cinédia, Carmen Santos, Atlântida; e a chanchada. Tudo isso ocorreu com o convívio da enorme precariedade técnica do cinema sonoro brasileiro, mas que mesmo assim permitiu que nossa identidade cultural fosse registrada e consagrada nos anos trinta e quarenta.

Atlântida

Em 18 de setembro de 1941, Moacir Fenelon e José Carlos Burle fundam a Atlântida Cinematográfica com um objetivo bem definido: promover o desenvolvimento industrial do cinema no Brasil. Liderando um grupo de aficcionados, entre os quais o jornalista Alinor Azevedo, o fotógrafo Edgar Brazil, e Arnaldo Farias, Fenelon e Burle prometiam fazer a necessária união de um cinema artístico com o cinema popular.

Durante quase dois anos são produzidos somente cinejornais, o primeiro deles “Atualidades Atlântida”. Da experiência adquirida com os cinejornais vem o primeiro longa-metragem, um documentário-reportagem sobre o IV Congresso Eucarístico Nacional, em São Paulo, em 1942. Junto, como complemento, o média-metragem “Astros em Desfile”, uma espécie de parada musical filmada com artistas famosos da época, antecipando o caminho que a Atlântida percorreria mais tarde.

Em 1943 acontece o primeiro grande sucesso da Atlântida: “Moleque Tião”, dirigido por José Carlos Burle, com Grande Otelo no papel principal e inspirado em dados biográficos do próprio ator. Hoje não existe sequer uma cópia do filme que, segundo a crítica, abria caminho para um cinema voltado às questões sociais ao invés de um cinema preocupado em divulgar apenas números musicais.

De 1943 a 1947 a Atlântida consolida-se como a maior produtora brasileira. Nesse período são produzidos 12 filmes, destacando-se “Gente Honesta” (1944), direção de Moacir Fenelon, com Oscarito no elenco, e “Tristezas Não Pagam Dívidas”, também de 1944, dirigido por José Carlos Burle. No filme Oscarito e Grande Otelo atuam juntos pela primeira vez, mas sem ainda formar a famosa dupla.

O ano de 1945 marca a estreia na Atlântida de Watson Macedo, que se transformaria num dos grandes diretores da companhia. Macedo dirige o filme “Não Adianta Chorar”, uma série de esquetes humorísticos entremeados com números musicais carnavalescos. No elenco Oscarito, Grande Otelo, Catalano, e outros comediantes do rádio e do teatro.

Em 1946, outro destaque: “Gol da Vitória”, de José Carlos Burle, com Grande Otelo no papel do craque Laurindo. Produção bastante popular sobre o mundo do futebol, lembrando em muitas cenas o célebre Leônidas da Silva (o “diamante negro”), o melhor jogar da época. Ainda em 1946, Watson Macedo faz a comédia musical “Segura Essa Mulher”, com Grande Otelo e Mesquitinha. Grande sucesso, inclusive na Argentina.

O filme seguinte, “Este Mundo é um Pandeiro”, de 1947, é fundamental para se entender as comédias da Atlântida, também conhecidas como chanchada. Nele, Watson Macedo delineava com grande precisão alguns detalhes que as chanchadas assumiriam mais tarde: a paródia à cultura estrangeira, em especial ao cinema feito em Hollywood, e uma certa preocupação em expor as mazelas da vida pública e social do país. Uma sequência antológica de “Este Mundo é um Pandeiro” mostra Oscarito travestido de Rita Hayworth parodiando uma cena do filme “Gilda”, e em outras cenas alguns personagens criticam o fechamento dos cassinos.

Dessa primeira fase da Atlântida resta apenas a comédia “Fantasma por Acaso”, de Moacir Fenelon. Os outros filmes perderam-se num incêndio nas instalações da empresa, em 1952.

Em 1947 ocorre a grande virada na história da Atlântida. Luiz Severiano Ribeiro Jr. torna-se sócio majoritário da empresa, integrando-se a um mercado que já dominava nos setores de distribuição e exibição. A partir daí, a Atlântida consolida suas comédias populares e a chanchada transforma-se na marca registrada da companhia.

A entrada de Severiano Ribeiro Jr. na Atlântida assegura, de imediato, maior penetração dos filmes junto ao grande público, definindo os parâmetros do sucesso da produtora. Controlando todas as fases do processo (produção, distribuição, exibição) e favorecido pela ampliação da reserva de mercado de um para três filmes, o esquema montado por Severiano Ribeiro Jr., que possuía também um laboratório para processamento dos filmes, considerado um dos mais modernos do país, representa uma experiência inédita na produção cinematográfica voltada exclusivamente para o mercado. Estava aberto o caminho para a chanchada. O ano de 1949 marca definitivamente a forma em que o gênero atingiria o clímax e atravessaria toda a década de 50.

Watson Macedo já demonstra em “Carnaval no Fogo” um perfeito domínio dos signos da chanchada, misturando habilmente os tradicionais elementos do “showbusiness” e do romance, com uma intriga policial envolvendo a clássica situação de troca de identidade.

Paralelo às chanchadas, a Atlântida envereda pelos chamados filmes sérios. O melodrama “Luz dos meus Olhos”, de 1947, dirigido por José Carlos Burle, abordando problemas raciais, não faz sucesso de público, mas é premiado pela crítica como melhor filme do ano. Adaptada do romance “Elza e Helena”, de Gastão Cruls, Watson Macedo realiza “A Sombra da Outra” e recebe o prêmio de melhor diretor de 1950.

Antes de sair da Atlântida e fundar sua própria produtora, Watson Macedo faz mais dois musicais para a empresa: “Aviso aos Navegantes”, em 1950, e “Aí Vem o Barão”, em 1951, consolidando a dupla Oscarito e Grande Otelo, verdadeiro fenômeno de bilheteria para o cinema no Brasil.

Em 1952 José Carlos Burle realiza “Carnaval Atlântida”, espécie de filme-manifesto, associando definitivamente a Atlântida ao carnaval, e abordando com humor o imperialismo cultural, tema quase sempre presente em seus filmes, e “Barnabé, Tu És Meu”, parodiando os antigos contos das “Mil e uma Noites”

Ainda em 1952, a Atlântida ruma pelo “thriller” romântico-policial. O filme é “Amei um Bicheiro”, dirigido pela dupla Jorge Ileli e Paulo Wanderley, considerado um dos mais importantes filmes produzidos pela Atlântida, embora não seguisse os esquema das chanchadas, trazia no elenco basicamente os mesmos atores desse tipo de comédia, inclusive Grande Otelo num notável desempenho dramático.

Mas a Atlântida se renova. Em 1953 um jovem diretor, Carlos Manga, faz seu primeiro filme. Em “A Dupla do Barulho”, Manga mostra já saber dominar os principais elementos narrativos do cinema feito em Hollywood. E é justamente essa identificação com o cinema norte-americano que marca esteticamente a dependência do cinema brasileiro com a indústria de Hollywood, num conflito sempre presente nos filmes da década de 50.

Depois da bem-sucedida estreia, Manga realiza em 1954, “Nem Sansão Nem Dalila” e “Matar ou Correr”, duas comédias modelos na utilização da linguagem da chanchada que superavam a gargalhada banal. “Nem Sansão Nem Dalila”, paródia à super-produção hollywoodiana “Sansão e Dalila”, de Cecil B. de Mille, e uma dos melhores exemplos de comédia brasileira de caráter político, satiriza as manobras para um golpe populista e as tentativas de neutralizá-lo.

“Matar ou Correr” é um delicioso faroeste tropical parodiando o clássico “Matar ou Morrer, de Fred Zinnemann. Destaque mais uma vez para a dupla Oscarito e Grande Otelo, e para a competente cenografia de Cajado Filho. Essas duas comédias firmam definitivamente o nome de Carlos Manga, mantendo como pontos de apoio o humor de Oscarito e Grande Otelo e os argumentos sempre criativos de Cajado Filho.

Oscarito, desde 1954 sem a parceria com Grande Otelo, continua demostrando seu talento em sequências memoráveis como nos filmes “O Golpe”, de 1955, “Vamos com Calma” e “Papai Fanfarão”, ambos de 1956, “Colégio de Brotos”, de 1957, “De Vento em Popa”, também de 1957, em que Oscarito faz uma hilariante imitação do ídolo Elvis Presley. Em 1958, Oscarito vive o personagem Filismino Tinoco, protótipo de funcionário público padrão, na comédia “Esse Milhão é Meu”, e em outra sensacional paródia, “Os Dois Ladrões”, de 1960, imita os trejeitos de Eva Todor em frente ao espelho, numa clara referência ao filme “Hotel da Fuzarca”, com os Irmãos Marx.

De todos os filmes dirigidos por Carlos Manga na Atlântida, “O Homem do Sputnik”, de 1959, talvez seja o que melhor sintetize o espírito irreverente da chanchada. Divertida comédia sobre a “guerra-fria”, “O Homem do Sputnik” faz uma contundente crítica ao imperialismo norte-americano e é considerado pelos especialistas os melhor filme produzido pela Atlântida. Além da impagável atuação de Oscarito, temos a exuberância da novata Norma Bengel e Jô Soares em seu primeiro papel no cinema.

Em 1962, a Atlântida produz seu último filme, “Os Apavorados”, de Ismar Porto. Depois associa-se a várias companhias nacionais e estrangeiras em coproduções. Em 1974, em conjunto com Carlos Manga, realiza “Assim Era a Atlântida”, coletânea contendo trechos dos principais filmes produzidos pela empresa.

Os filmes da Atlântida representaram a primeira experiência brasileira de longa duração na produção cinematográfica voltada para o mercado com um esquema industrial autossustentável.

Para o espectador, o fato de encontrar na tela tipos populares como o herói malandro e desocupado, os mulherengos e preguiçosos, as empregadas domésticas e as donas de pensão, os imigrantes nordestinos, provoca grande receptividade.

Mesmo pretendendo, em certos aspectos, imitar o modelo hollywoodiano, as chanchadas transpiram uma inconfundível brasilidade ao colocar em relevo os problemas cotidianos da época.

Presentes na linguagem da chanchada, elementos do circo, do carnaval, do rádio e do teatro. Atores e atrizes de grande popularidade no rádio e no teatro ficam imortalizados através das chanchadas. Ficam registradas, também, consagradas músicas carnavalescas e os sucessos do rádio.

Em nenhum outro momento de sua história, o cinema no Brasil tem tanta aceitação popular. Carnaval, homem urbano, burocracia, demagogia populista, temas sempre presentes nas chanchadas, abordados com vivacidade e o insuperável humor carioca.

Os filmes da Atlântida e particularmente as chanchadas formam o retrato de um país em transição, abdicando dos valores de uma sociedade pré-industrial e ingressando na vertiginosa ciranda da sociedade de consumo, cujo modelo teria num novo meio (a TV) o seu grande sustentáculo.

Vera Cruz

Nos vinte primeiros anos do cinema falado, a produção paulista foi quase inexistente, enquanto que a carioca se consolidou e prosperou com as famosas chanchadas da Atlântida. Precárias comédias carnavalescas e recheadas com sucessos musicais do momento. Eram sucesso garantido de público.

Baseando-se nisso, Zampari resolve criar uma companhia para produzir filmes de qualidade como os de Hollywood. A Vera Cruz era uma empresa moderna e ambiciosa, que dispunha do apoio da burguesia de São Paulo, a metrópole econômica do País. O surgimento da Vera Cruz reflete aspectos da história cultural do Brasil: a influência italiana, o papel de São Paulo na modernização da cultura, o surgimento e as dificuldades das indústrias culturais no país e as origens da produção audiovisual brasileira.

De fato o modelo da Vera Cruz era Hollywood, mas a mão de obra qualificada foi importada da Europa: o fotógrafo era britânico, o editor austríaco e o engenheiro de som dinamarquês. Pessoas de mais de vinte e cinco nacionalidades trabalharam na Vera Cruz, mas os italianos eram mais numerosos. A companhia foi construída em São Bernardo do Campo e ocupava 100 mil metros quadrados.

Os equipamentos para os estúdios eram todos importados. O sistema de som tinha oito toneladas de aparelhos e veio de Nova York. Na época, era a maior carga área enviada da América do Norte para a América do Sul. As câmeras, apesar de segunda mão, eram as mais modernas do mundo e estavam em ótimo estado. Enquanto chegavam os equipamentos, eram montadas as salas de cortes, carpintaria, almoxarifado, restaurante, além das casas e os apartamentos dos artistas.

Um grande nome da produtora era Alberto Cavalcanti, brasileiro que começou trabalhando na França na chamada avant-garde, colaborando em produções dos estúdios franceses de Joinville, estimulou e inspirou a renovação do documentário britânico. Cavalcanti estava em São Paulo para uma série de conferências quando foi convidado pelo próprio Zampari para dirigir a Vera Cruz. Cavalcanti gostou da ideia, assinou contrato e teve carta branca para fazer tudo o que quisesse como diretor geral da companhia.

Fechou contratos com a Universal e Columbia Pictures para a distribuição mundial dos filmes que iria fazer. Ele achava que seria impossível o mercado interno cobrir os custos das produções que estavam sendo planejadas. Porém com sua personalidade exigente e intrigante, Cavalcanti produz dois filmes, briga com os donos da companhia e pede demissão. A saída de Cavalcanti em 1951 é a primeira de uma série de crises que levará a Vera Cruz a falir.

Em 1953, o objetivo de se produzir e lançar seis filmes em um ano é atingido: “Uma Pulga na Balança”, “A família Lero-Lero”, “Esquina da Ilusão”, “Luz Apagada” e mais duas super produções de enorme sucesso nas bilheterias nacionais e internacionais: “Sinhá Moça” e “O Cangaceiro”.

Estes dois últimos darão a Vera Cruz espaços nos exigentes circuitos europeus, além da primeira grande premiação internacional de nosso cinema. “O Cangaceiro” recebe prêmio de melhor filme de aventura no Fesival de Cannes. Fatura só no mercado brasileiro 1,5 milhões de dólares. Fica para a produtora apenas 500 mil dólar deste total, pouco mais da metade do custo do filme, que foi de 750 mil dólares. No exterior, o faturamento alcança milhões de dólares. Na década de 50, foi considerada uma das maiores bilheterias da Columbia Pictures. Porém, nenhum dólar a mais viria para a Vera Cruz, já que toda comercialização internacional pertencia à Columbia.

No auge do sucesso a Vera Cruz está financeiramente quebrada. Pode-se dizer que o maior sucesso da Vera Cruz virou seu maior prejuízo. Sem saída, a Vera Cruz caminha para o encerramento de suas atividades com uma dívida gigantesca. O credor principal, o Banco do Estado de São Paulo, assume a direção da empresa e agiliza a conclusão dos últimos filmes: o policial “Na senda do crime”; a comédia “É proibido beijar”, outro filme com Mazzaropi; “Candinho” e a última superprodução que conquistou sucesso de bilheteria, “Floradas na Serra”.

No fim do ano de 1954, as atividades da empresa chegam ao fim. É o fim também para Zampari, que aplicou toda sua fortuna pessoal numa dramática tentativa de salvar a Vera Cruz. O depoimento de sua esposa, Débora Zampari, para Maria Rita Galvão, no livro “Burguesia e Cinema: O Caso Vera Cruz”, diz tudo. “Nós levávamos uma boa vida. A Vera Cruz foi um sorvedouro, um Moloch que consumiu tudo o que era nosso, inclusive a saúde e a vitalidade de meu marido. Ele nunca conseguiu se recuperar do golpe. Morreu amargurado, pobre e só.”

Identide Nacional

Em meados da década de 50, começa a surgir uma estética nacional. Nesta época são produzidos “Agulha no palheiro” (1953), de Alex Viany, “Rio 40 graus” (1955), de Nelson Pereira dos Santos, e “O grande momento” (1958), de Roberto Santos, inspirados no neo-realismo italiano. A temática e os personagens começam a expressar uma identidade nacional e lançam a semente do Cinema Novo. Paralelamente, destaca-se o cinema de Anselmo Duarte, premiado em Cannes, em 1962, com “O pagador de promessas”, e dos diretores Walther Hugo Khouri, Roberto Farias (“Assalto ao trem pagador”) e Luís Sérgio Person (“São Paulo S.A.”).

O paulista Nelson Pereira dos Santos desde o final da década de 40 frequentava cineclubes e realizava curtas de 16 milímetros. Seu filme de estreia, “Rio 40 graus” (1954), marca uma nova fase no cinema brasileiro, de busca da identidade nacional, seguido por “Rio Zona Norte” (1957),”Vidas secas” (1963), “Amuleto de Ogum” (1974), “Memórias do cárcere” (1983), “Jubiabá” (1985) e “A terceira margem do rio” (1994).

Roberto Santos, também paulista, trabalhava nos estúdios da Multifilmes e Vera Cruz como continuista e assistente de direção. Posteriormente, realiza alguns documentários como “Retrospectivas” e “Judas na passarela”, na década de 70. “O grande momento”, de 1958, seu filme de estreia, aproxima-se do neo-realismo e reflete os problemas sociais brasileiros. Seguem, entre outros, “A hora e a vez de Augusto Matraga” (1965), “Um anjo mau” (1971) e “Quincas Borbas” (1986).

Walter Hugo Khouri produzia e dirigia teleteatros para a TV Record, na década de 50. Nos estúdios da Vera Cruz, começa fazendo preparação de produção e, em 1964, passa à frente da companhia. Influenciado por Bergman, sua produção enfoca os problemas existenciais, com trilha sonora refinada, diálogos inteligentes e mulheres sensuais. Autor completo de seus filmes, faz roteiro, direção, orienta a montagem e a fotografia. Depois de “O gigante de pedra” (1952), seu primeiro filme, segue-se “Noite vazia” (1964), “O anjo da noite” (1974), “Amor estranho amor” (1982), “Eu” (1986) e “Forever” (1988), entre outros.

Cinema Novo

Durante a década de 60, diversos movimentos culturais, políticos e sociais estouraram pelo mundo. No Brasil, o movimento no cinema ficou conhecido como “Cinema Novo”. Ele tratava os filmes como veículos para a demonstração dos problemas político-sociais do país. Esse movimento teve grande força em países como França, Itália, Espanha e principalmente Brasil. Aqui, o Cinema Novo tornou-se uma espécie de arma do povo, nas mãos dos cineastas, contra o governo.

“Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” é o lema dos cineastas que, nos anos 60, se propõem a realizar filmes de autor, baratos, com preocupações sociais e enraizados na cultura brasileira.

O Cinema Novo dividiu-se em 2 fases: a primeira, de fundo rural, desenvolveu-se entre 1960 e 1964, e a segunda, de fundo político, tornou-se presente a partir de 1964, desenrolando-se durante praticamente todo o período de ditadura militar no Brasil.

O Cinema Novo foi iniciado no Brasil por influencia de um movimento anterior, chamado neo-realismo. No neo-realismo, os cineastas trocavam os estúdios pelas ruas e, desse modo, acabaram por chegar no campo.

A partir daí, começa a primeira fase do período de maior reconhecimento do cinema nacional. Essa fase preocupava-se em trazer à tona o problema da terra e o modo de vida daqueles que nela viviam. Não apenas discutiam a questão da reforma agrária, mas principalmente as tradições, a ética e a religião do homem do campo. Temos como grandes exemplos os filmes de Glauber Rocha, o maior representante do cinema novo no Brasil, as obras de maior repercussão foram “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964) de Glauber Rocha, “Vidas secas” (1963), de Nelson Pereira dos Santos, “Os fuzis”, de Rui Guerra e “O Pagador de Promessas” de Anselmo Duarte (1962), ganhador da Palma de Ouro em Cannes naquele ano.

A segunda fase do Cinema Novo brasileiro começa juntamente com o governo militar que teve vigência no período 1964-1985. Nessa fase, os cineastas estavam preocupados em agregar a seus filmes um certo caráter de engajamento político. Porém, devido à censura, esse caráter político tinha que ser disfarçado. Temos como bons exemplos dessa fase “Terra em Transe” (Glauber Rocha), “A falecida” (Leon Hirszman), “O desafio” (Paulo César Sarraceni), “A grande cidade” (Carlos Diegues) “Eles não usam Black-Tie” (Leon Hirszman), “Macunaíma” (Joaquim Pedro de Andrade), “Brasil ano 2000″ (Walter Lima Jr.), “O bravo guerreiro” (Gustavo Dahl) e “Pindorama” (Arnaldo Jabor).

Seja discutindo problemas rurais ou políticos, o Cinema Novo brasileiro foi de extrema importância. Além de tornar o Brasil reconhecido como país de grande importância no cenário cinematográfico mundial, trouxe ao público alguns problemas que eram mantidos longe da vista popular.

Glauber Rocha é o grande nome do cinema brasileiro. Iniciou a carreira em Salvador, como crítico de cinema e documentarista, realizando “O pátio” (1959) e “Uma cruz na praça” (1960). Com “Barravento” (1961), é premiado no Festival de Karlovy Vary, na Tchecoslováquia. “Deus e o diabo na terra do sol” (1964), “Terra em transe” (1967) e “O dragão da maldade contra o santo guerreiro” (1969) ganham prêmios no exterior e projetam o Cinema Novo. Nesses filmes predomina uma linguagem nacional e de caráter popular, que se distingue daquela do cinema comercial americano, presente em seus últimos filmes, como “Cabeças cortadas” (1970), filmado na Espanha, e “A idade da terra” (1980).

Joaquim Pedro de Andrade em sua primeira experiência profissional trabalha como assistente de direção. No final da década de 50, dirige seus primeiros curtas, “Poeta do castelo” e “O mestre de Apipucos”, e participa do Cinema Novo dirigindo importantes obras, como “Cinco vezes favela – 4o episódio: Couro de gato” (1961), “Garrincha, alegria do povo” (1963), “O padre e a moça” (1965), “Macunaíma” (1969) e “Os inconfidentes” (1971).

Cinema Marginal

No final da década de 60, jovens diretores ligados inicialmente ao Cinema Novo vão aos poucos rompendo com a antiga tendência, em busca de novos padrões estéticos. “O bandido da luz vermelha”, de Rogério Sganzerla e “Matou a família e foi ao cinema”, de Júlio Bressane, são os filmes-chave dessa corrente underground alinhada com o movimento mundial de contracultura e com a explosão do tropicalismo na MPB.

Dois autores têm, em São Paulo, suas obras consideradas como inspiradoras do cinema marginal: Ozualdo Candeias (“A margem”) e o diretor, ator e roteirista José Mojica Marins (“No auge do desespero”, “À meia-noite levarei sua alma”), mais conhecido como Zé do Caixão.

Tendências Contemporâneas

Em 1966 o Instituto Nacional de Cinema (INC) substitui o INCE, e é criada em 1969 a Empresa Brasileira de Filmes (Embrafilme) para financiar, coproduzir e distribuir os filmes brasileiros. Há então uma produção diversificada que atinge o auge em meados dos anos 80 e, gradativamente, começa a declinar. Alguns sinais de recuperação são notados em 1993.

Anos 70

Remanescentes do Cinema Novo ou cineastas estreantes, em busca de um estilo de comunicação mais popular, produzem obras significativas. “São Bernardo”, de Leon Hirszman; “Lição de amor”, de Eduardo Escorel; “Dona Flor e seus dois maridos”, de Bruno Barreto; “Pixote”, de Hector Babenco; “Tudo bem” e “Toda a nudez será castigada”, de Arnaldo Jabor; “Como era gostoso o meu francês”, de Nelson Pereira dos Santos; “A dama do lotação”, de Neville d’Almeida; “Os inconfidentes”, de Joaquim Pedro de Andrade, e “Bye, bye, Brasil”, de Cacá Diegues, refletem as transformações e contradições da realidade nacional.

Pedro Rovai (“Ainda agarro essa vizinha”) e Luís Sérgio Person (“Cassy Jones, o magnífico sedutor”) renovam a comédia de costumes numa linha seguida por Denoy de Oliveira (“Amante muito louca”) e Hugo Carvana (“Vai trabalhar, vagabundo”).

Arnaldo Jabor começa sua carreira escrevendo críticas de teatro. Participa do movimento do Cinema Novo, realizando curtas – “O circo” e “Os saltimbancos” – e estreia no longa-metragem com o documentário “Opinião pública” (1967). Produz em seguida “Pindorama” (1970). Adapta dois textos de Nelson Rodrigues: “Toda nudez será castigada” (1973) e “O casamento” (1975). Prossegue com “Tudo bem” (1978), “Eu te amo” (1980) e “Eu sei que vou te amar” (1984).

Carlos Diegues e começa a dirigir filmes experimentais aos 17 anos. Faz críticas de cinema e desenvolve atividades como jornalista e poeta. Posteriormente, dirige curtas e trabalha como argumentista e roteirista. Um dos fundadores do Cinema Novo realiza “Ganga Zumba” (1963), “Quando o carnaval chegar” (1972), “Joana Francesa” (1973), “Xica da Silva” (1975), “Bye, bye Brasil” (1979) e “Quilombo” (1983), entre outros.

Hector Babenco, produtor, diretor e roteirista inicia sua carreira como figurante no filme “Caradura”, de Dino Risi, filmado na Argentina, em 1963. Em 1972, já no Brasil, funda a HB Filmes e dirige curtas como “Carnaval da vitória” e “Museu de Arte de São Paulo”. No ano seguinte, faz o documentário “O fabuloso Fittipaldi”. Seu primeiro longa-metragem, “O rei da noite” (1975), retrata a trajetória de um boêmio paulistano. Seguem “Lúcio Flávio, o passageiro da agonia” (1977), “Pixote, a lei do mais fraco” (1980), “O beijo da mulher aranha” (1985) e “Brincando nos campos do senhor” (1990).

Pornochanchada

No esforço para reconquistar o público perdido, a “Boca do Lixo” paulista produz “pornochanchadas”. Influência de filmes italianos em episódios retomados de títulos chamativos e eróticos, e reinserção da tradição carioca na comédia popular urbana marcam uma produção que, com poucos recursos, consegue uma boa aproximação com o público, como “Memórias de um gigolô”, “Lua-de-mel e amendoim” e “A viúva virgem”. No início dos anos 80, evoluem para filmes de sexo explícito, de vida efêmera.

Década de 80

A abertura política favorece a discussão de temas antes proibidos, como em “Eles não usam black-tie”, de Leon Hirszman, e “Pra frente, Brasil”, de Roberto Farias, que é o primeiro a discutir a questão da tortura. “Jango e Os anos JK”, de Silvio Tendler, relatam a história recente e “Rádio auriverde”, de Silvio Back, dá uma visão polêmica da atuação da Força Expedicionária Brasileira na 2a. Guerra.

Surgem novos diretores como Lael Rodrigues (“Bete Balanço”), André Klotzel (“Marvada carne”) e Susana Amaral (“A hora da estrela”). No final da década, a retração do público interno e a atribuição de prêmios estrangeiros a filmes brasileiros fazem surgir uma produção voltada para a exibição no exterior: “O beijo da mulher aranha”, de Hector Babenco, e “Memórias do cárcere”, de Nelson Pereira dos Santos. As funções da Embrafilme, já sem verbas, começam a esvaziar-se, em 1988, com a criação da Fundação do Cinema Brasileiro.

Década de 90

A extinção da Lei Sarney e da Embrafilme e o fim da reserva de mercado para o filme brasileiro fazem a produção cair quase a zero. A tentativa de privatização da produção esbarra na inexistência de público num quadro onde é forte a concorrência do filme estrangeiro, da tevê e do vídeo. Uma das saídas é a internacionalização, como em A grande arte, de Walter Salles Jr., coproduzida com os EUA.

O 25o Festival de Brasília (1992) é adiado por falta de filmes concorrentes. No de Gramado, internacionalizado para poder sobreviver, só se inscrevem, em 1993, dois filmes brasileiros: “Capitalismo selvagem”, de André Klotzel, e “Forever”, de Walter Hugo Khouri, rodado com financiamento italiano.

A partir de 1993 há uma retomada da produção nacional através do Programa Banespa de Incentivo à Indústria Cinematográfica e do Prêmio Resgate Cinema Brasileiro, instituído pelo Ministério da Cultura. Diretores recebem financiamentos para a produção, finalização e comercialização dos filmes. Aos poucos, as produções vão aparecendo, como “A terceira margem do rio”, de Nelson Pereira dos Santos, “Alma corsária”, de Carlos Reichenbach, “Lamarca”, de Sérgio Rezende, “Vagas para moças de fino trato”, de Paulo Thiago, “Não quero falar sobre isso agora”, de Mauro Farias, “Barrela – escola de crimes”, de Marco Antônio Cury, “O Beijo 2348/72″, de Walter Rogério, e “A Causa Secreta”, de Sérgio Bianchi.

A parceria entre televisão e cinema acontece em “Veja esta canção”, dirigido por Carlos Diegues e produzido pela TV Cultura e pelo Banco Nacional. Em 1994, novas produções, em preparação ou mesmo finalizadas, apontam: “Era uma vez”, de Arturo Uranga, “Perfume de gardênia”, de Guilherme de Almeida Prado, “O corpo”, de José Antonio Garcia, “Mil e uma”, de Susana Moraes, “Sábado”, de Ugo Giorgetti, “As feras”, de Walter Hugo Khouri, “Foolish heart”, de Hector Babenco, “Um grito de amor”, de Tizuka Yamasaki, e “O cangaceiro”, de Carlos Coimbra, um remake do filme de Lima Barreto.

Por: Eduardo de Figueiredo Caldas

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