Resumos de Livros

Memórias de um Sargento de Milícias

Em síntese, o enredo de Memórias de um Sargento de Milícias é tecido com muitas peripécias e intrigas, que não deixam, ainda hoje, de entreter e prender o leitor.

Pode resumir-se na história da vida de Leonardo filho de dois imigrantes portugueses, a sabia Maria da Hortaliça e Leonardo, “algibebe” em Lisboa e depois meirinho no Rio do tempo do Rei D. João VI:

Nascimento do “herói”, sua infância de endiabrado, suas desditas de filho abandonado mas sempre salvo de dificuldades pelos padrinhos (a parteira e um barbeiro); sua juventude de valdevinos; seus amores com a dengosa mulatinha Vidinha; suas malandrices com o truculento Major Vidigal, chefe de polícia; seu namoro com Luisinha; sua prisão pelo major; seu engajamento, por punição, no corpo de tropa do mesmo major; finalmente, porque os fados acabaram por lhe ser propícios e não lhe faltou a proteção da madrinha, tudo tem “conclusão feliz”: promoção a sargento de milícias e casamento com Luisinha”.

Livro Memórias de um Sargento de Milícias

Resumo por capítulo:

Para que se tenha uma ideia mais precisa do conteúdo do livro no que se refere ao enredo, vamos transcrever aqui o resumo elaborado pelo Prof. José Rodrigues Gameiro em estudo sobre Memórias de um Sargento de Milícias, no qual o presente trabalho está apoiado.

A obra está dividida em duas partes: a primeira com vinte e três capítulos e a segunda com vinte e cinco.

Primeira Parte

I – Origem

Nascimento e Batizado. A novela se abre com a frase “Era no tempo do rei”, que situa a estória no século XIX, no Rio de Janeiro. Narra a vinda de Leonardo-Pataca para o Brasil. Ainda no navio, namora com uma patrícia, Maria da Hortaliça, sabia portuguesa. Daí resultou o casamento e…

“sete meses depois teve a Maria um filho, formidável menino de quase três palmos de comprido, gordo e vermelho, cabeludo, espemeador e chorão; o qual, logo depois que nasceu, mamou duas horas seguidas sem deixar o peito”.

Esse menino é o Leonardo, futuro “sargento de milícias” e o “herói” do livro.

O capitulo termina com o batizado do garoto, tendo a “Comadre” por madrinha e o. barbeiro ou “Compadre” por padrinho, personagens importantes da estória.

II – Primeiros Infortúnios.

Leonardo-Pataca descobre que Maria da Hortaliça, sua mulher, o traía com vários homens; dá-lhe uma surra e ela foge com um capitão de navio para Portugal.

O filho, depois de levar um pontapé no traseiro, é abandonado e o padrinho se encarrega dele.

III – Despedida às Travessuras.

O padrinho, já velho, e sem ter a quem dedicar sua afeição, ficou caído pelo garoto, concentrando todos os seus esforços no futuro de Leonardo e desculpando todas as suas travessuras.
Depois de muito pensar, resolveu que ele seria padre.

IV – Fortuna.

Leonardo-Pataca apaixonou-se por uma cigana que também o abandona. Para atraí-la novamente, recorre a feitiçarias de um caboclo velho e imundo que morava num mangue. Na última prova, à noite, quando estava nu e coberto com o manto do caboclo, aparece o Major Vidigal…

V – O Vidigal.

Este capítulo descreve o Major – “um homem alto, não muito gordo, com ares de moleirão; tinha o olhar sempre baixo, os movimentos lentos, e a voz descansada e adocicada”. Era a polícia e a justiça da época, na cidade.

Depois de obrigar todos que se achavam na casa do caboclo a dançar, até não aguentarem mais, chicoteia-os e leva Leonardo para a “Casa da Guarda”, espécie de depósito de presos. Depois de visto pelos curiosos, é transferido para a cadeia.

VI – Primeira Noite Fora de Casa.

Leonardo filho vai acompanhar uma “Via Sacra” de rua”, muito comum naquela época, e junta-se a outros moleques. Acabam passando a noite num acampamento de ciganos. Descreve-se a festa e a dança do fado. De manhã, Leonardo pede para voltar para casa.

VII – A Comadre.

Era a madrinha de Leonardo – “uma mulher baixa, excessivamente gorda, bonachona, ingênua ou tola até um certo ponto, e finória até outro; vivia do oficio de parteira, que adotara por curiosidade e benzia de quebranto…”. Gostava de ir à missa e ouvir o cochicho das beatas. Viu a vizinha do barbeiro e logo quis saber do que é que ela falava.

VIII – O Pátio dos Bichos.

Assim era chamada a sala onde ficavam os velhos oficiais a serviço de El-Rei, esperando qualquer ordem.
No meio deles, estava um Tenente-Coronel a quem a Comadre vai pedir para interceder junto a El-Rei para soltar Leonardo-Pataca.

IX – O Arranjei-me do Compadre.

O autor conta-nos como o barbeiro conseguiu arranjar-se na vida, apesar de sua profissão pouco rentável: improvisou-se de médico, ou melhor, “sangrador”, a bordo de um navio que vinha para o Brasil. O Capitão moribundo, entregou-lhe todas as economias para que as levasse à sua filha (do Capitão). Quando chegou a terra, ficou com tudo e nunca procurou a herdeira.

X – Explicações.

O Tenente-Coronel interessara-se pelo Leonardo porque, de certa forma, ele o havia livrado de certa obrigação: seu filho, um desmiolado, é que havia infelicitado a tal de Mariazinha, a Maria da Hortaliça, ex-mulher de Leonardo. Por isso empenha-se e, por meio de um outro amigo, consegue que El-Rei solte Leonardo.

XI – Progresso e Atraso.

Este capítulo é dedicado às dificuldades que o padrinho encontra para ensinar as primeiras letras ao afilhado e às implicâncias da vizinha. A seguir vem um bate-boca entre os dois, com o menino arremedando a velha, e com grande satisfação para o barbeiro que se julga “vingado”.

XII – Entrada para a Escola.

É uma descrição das escolas da época. Aborda a importância da palmatória e nos conta como o novo e endiabrado aluno leva bolos de manhã e à tarde.

XIII – Mudança de Vida.

Depois de muito esforço e paciência, o padrinho convence ao afilhado de voltar para a escola, mas ele foge habitualmente e faz amizade com o coroinha da Igreja. Pede ao padrinho, e este acede, para também ser coroinha. Pensava assim o barbeiro que seria meio caminho andado para se tomar padre. Como coroinha, aproveitou-se dessa função para jogar fumaça de incenso na cara da vizinha e derramar-lhe cera na mantilha. Vingava-se assim dela.

XIV – Nova Vingança e Seu Resultado.

Neste capitulo, aparece o “Padre Mestre de Cerimônias”, que, embora de um exterior austero, mantinha relações com a cigana, a mesma que abandonara Leonardo-Pataca e fora causa de sua função. No dia da festa da Igreja da Sé, o Mestre de Cerimônia prepara-se orgulhosamente para proferir seu sermão.
O menino Leonardo, encarregado de avisar-lhe a hora do sermão, informa-lhe que será às 10 horas, quando na verdade devia ser às 9.

Um capuchinho italiano, para cooperar, e porque o pregador não chegava, começou a homilia.
Depois de algum tempo, chega o Mestre, furioso, e corre para o púlpito também. Após um bate-papo com o religioso, toma o lugar dele e continua o sermão. O resultado foi o sacristão ser despedido.

XV – Estralada.

Leonardo-Pataca, sabendo que o Mestre de Cerimônias é que lhe tirara a cigana e que este iria ao aniversário dela, contratou Chico-Juca para criar confusão na festa. Avisou antecipadamente o Major Vidigal, que prende todo mundo, inclusive o Padre, e os leva para a “Casa da Guarda”.

XVI – Sucesso do Plano.

O Mestre de Cerimônias, com o escândalo, foi obrigado a deixar a cigana, voltando para Leonardo, que recebe as censuras da Comadre.

Segunda parte

I – A Comadre em Exercício.

Aqui, o autor narra o nascimento da filha de Leonardo-Pataca e de Chiquinha. A Comadre faz o parto, e o autor aproveita para fazer interessante descrição dos costumes da época.

II – Trama.

A Comadre, numa aliança com o sobrinho e o Compadre contra José Manuel, inventa para D. Maria que este fora o raptor da moça na porta da Igreja (um caso policial da época).

III – Derrota.

José Manuel põe-se em campo para saber quem é seu adversário e quem tinha feito a intriga perante D. Maria.

IV – O Mestre de Reza.

Os mestres de reza da época eram geralmente cegos que ensinavam às crianças as primeiras rezas e o catecismo. Faziam-no á base da palmatória. O Mestre de Reza encarregou-se de descobrir, para José Manuel, quem era o intrigante.

V – Transtorno.

O Compadre morre e deixa Leonardo como seu herdeiro. Segue-se a cerimônia de luto e o enterro. Leonardo volta para a casa do pai. A Comadre, que também mora com a filha, faz agora as vezes do Compadre. Leonardo não se entende com a madrasta, Chiquinha.

VI – Pior Transtorno.

Leonardo, ao voltar da casa de Luisinha, aborrecido por não a ter visto, briga com Chiquinha. O pai intervém de espada, e Leonardo foge de casa.

A Comadre censura os dois e vai procurar o afilhado, enquanto os vizinhos comentam as ocorrências…

VII – Remédio dos Males.

Ao fugir de casa, Leonardo encontra o antigo colega, o Sacristão da Sé, num pique-nique em companhia de moças e rapazes, o qual o convida para ficar; ele aceita e enche-se de amores por Vidinha, cantora de modinhas, que tocava viola.

“Vidinha era uma mulatinha de dezoito a vinte anos, de altura regular. ombros largos, peito alteado, cintura fina e pés pequeninos; tinha os olhos muito pretos e muito vivos, os lábios grossos e úmidos, os dentes alvíssimos. a fala era um pouco descansada, doce e afinada.”

VIII – Novos Amores.

Este capitulo faz a descrição da nova família que acolhe Leonardo. Era composta de duas irmãs viúvas, uma com três filhos e a outra com três filhas. Passavam dos quarenta anos e eram muito gordas e parecidas. Os três filhos da primeira tinham mais de 20 anos e eram empregados no trem. As moças, mais ou menos da idade dos rapazes, eram bonitas, cada uma a seu modo. Uma delas era Vidinha.

IX – José Manuel Triunfa.

A Comadre procurou Leonardo por toda parte e, não o encontrando, foi à casa de D. Maria, que a repreendeu por “ter cometido um grande…”

Ela logo entendeu e percebeu que José Manuel estava regenerado aos olhos de D. Maria; e também chegou à conclusão de que o cego Mestre de Reza é que tinha desvendado tudo.
A Comadre desculpa-se e toma conhecimento do interesse de José Manuel por Luisinha.

X – O Agregado.

Leonardo fica agregado na nova família, como era costume naquela época. Dois irmãos pretendentes a Vidinha unem-se contra Leonardo, que estava gostando dela.

Vidinha e as Velhas tomam o partido de Leonardo. Houve briga e confusões.

Leonardo decidiu sair da casa, mas as velhas não consentem. Chega a Comadre.

XI – Malsinação.

Depois de conferências entre as velhas e a Comadre, Leonardo fica, para alegria de Vidinha.
Os primos vencidos, combinam um modo de vingar-se.

Fizeram uma patuscada semelhante à que haviam feito quando conheceram Leonardo e avisaram o Major Vidigal… Este chega no meio da farra e prende Leonardo.

XII – Triunfo Completo de José Manuel.

José Manuel ganha uma causa forense para D. Maria e, com isso, consegue o consentimento para casar-se com Luisinha, que Leonardo já havia esquecido; ela aceita com indiferença o novo pretendente. Há festa e casamento em carruagens – “destroços da arca de Noé”.

XIII – Escápula.

A caminho da prisão, Leonardo procura um jeito de fugir. O Major adivinha o pensamento do moço e presta atenção a todos os seus movimentos. Entretanto, na hora em que surgiu um pequeno tumulto na rua, e o Major desviou a atenção do prisioneiro, Leonardo escapuliu e foi para a casa de Vidinha.
O Major, pasmado com o acontecido, procura-o por toda parte, com os granadeiros.

XIV – O Vidigal Desapontado.

Vidigal, com o orgulho ferido, sobretudo devido às zombarias do povo, jurou vingar-se. A Comadre, entretanto, que não sabia da fuga, procura o Major e, ajoelhada a seus pés, chora e suplica pelo afilhado.
Os granadeiros riam dela cada vez que gritava – solte, solte!

XV – Caldo Entornado.

Tendo sabido da fuga de Leonardo, a Comadre dirigiu-se à casa das velhas e pregou um sermão ao afilhado, concitando-o a que abandonasse a vadiagem e procurasse um emprego. Ela mesma consegue para ele uma ocupação na “Ucharia Real”.

O Major não gostou disso porque assim não poderia prendê-la Ucharia, morava um tal de Toma-Largura, assim chamado pela sua estampa grotesca, em companhia de uma mulher bonita Leonardo começa a demorar cada vez mais no trabalho e a esquecer Vidinha.

Um dia, Toma-Largura surpreendeu-o tomando sopa com sua mulher e corre atrás dele escorraçando-o de casa. No dia seguinte, Leonardo é despedido do emprego.

XVI – Ciúmes.

Vidinha, extremamente ciumenta, quando soube do acontecido, foi tomar satisfação com a mulher do Toma-Largura, depois de gritar, chorar e ameaçar.

Leonardo vai atrás e se encontra com o Major Vidigal, que o prende.

XVII – Fogo de Palha.

Vidinha começa a xingar Toma-Largura e a mulher. Como não houvesse reação dos dois, ficou desconcertada, tomou a mantilha e saiu. Toma-Largura, encantado com Vidinha, resolveu conquistar nem que fosse uma diminuta parcela de seu amor, porque assim se vingaria de Leonardo e satisfaria seu desejo de conquista amorosa. Desse modo, acompanhou a moça para saber onde ela morava.

XVIII – Represálias.

Quando Vidinha chegou a casa, deram também por falta de Leonardo. Mandam-no procurar por toda parte e nada. Suspeitam do Major, mas não o encontram na Casa da Guarda.

A Comadre, avisada, põe-se em campo à procura do afilhado, mas também não o encontra. A família que hospedava Leonardo começou a odiá-lo, julgando que ele se havia ocultado propositalmente.
Enquanto isso, o Toma-Largura começa a rodear a casa de Vidinha para cumprimentá-la. Mal imagina ele o que lhes estão preparando…

Recebido em casa, resolvem comemorar a aproximação com uma patuscada nos “Cajueiros”, no mesmo lugar onde Leonardo conhecera a família. E claro que o Toma-Largura lá estava. E como gosta de beber, acabou provocando uma grande confusão na festa. Inesperadamente chega o Vidigal com um grupo de granadeiros e dá ordem a um deles para levar o Toma-Largura preso. Este granadeiro era Leonardo.

XIX – O Granadeiro.

Depois de preso, o Toma-Largura foi abandonado na calçada porque estava completamente bêbado e sem condições de andar. A seguir, o autor conta como Leonardo fora transformado em granadeiro: depois de preso foi escondido por Vidigal e levado para sentar praça no Regimento Novo. A seguir, foi requisitado para ajudar o Major nas tarefas policiais. Era a maneira de o Vidigal se vingar.

Leonardo mostrou-se bom de serviço, mas participou de uma “diabrura” quando, em missão, representou Vidigal, defunto, numa cena para ridicularizá-lo.

XX – Novas Diabruras.

O Major decide prender Teotônio, um grande animador de festas, onde tocava e cantava modinhas e mostrava outras habilidades, como banqueiro de jogo.

Teotônio, na festa de batizado do filho de Leonardo-Pataca com a filha da Comadre, fez caretas e mímicas imitando o Major, que estava presente, para risada geral do público. O Major sai correndo e incumbe Leonardo de prender Teotônio.

Leonardo, muito bem recebido na casa, revela a missão de que estava incumbido e, de comum acordo com Teotônio, concebe um plano para lograr o Major.

XXI – Descoberta.

Leonardo foi cumprimentado por um amigo indiscreto, na frente do Major, pela façanha, e este o prende imediatamente.

Enquanto isso, o José Manuel, depois da lua-de-mel com Luisinha, começou a mostrar que não era lá grande coisa. Isso fez com que D. Maria se aliasse à Comadre para soltar Leonardo.

XXII – Empenhos.

Depois de uma tentativa frustrada junto ao Major, a Comadre pede os préstimos de D. Maria que, por sua vez, recorre a Maria Regalada. Chamava-se assim por ser muito alegre, ria-se de tudo. Morava na Prainha, e, quando mais nova, era uma “mocetona de truz”. Já era conhecida do Major, com quem há tempos tivera encontros amorosos.

XXIII – As Três em Comissâo.

As três vão ao Major pedir-lhe para soltar Leonardo. Ele mostra-se inicialmente inflexível como o cargo e o lugar exigiam. Como as três rompessem em prantos, ele não se conteve e chorou também, feito um bobo. Depois recompôs-se e ficou novamente durão.

Entretanto, Maria Regalada cochichou-lhe qualquer coisa ao ouvido, e ele logo promete não somente soltar Leonardo como alguma coisa mais.

XXIV – A Morte é Juiz.

José Manuel, com a ação que lhe moveu a sogra, tem um ataque de apoplexia e morre.

Leonardo, libertado, chega à noitinha e a primeira coisa que procura é Luisinha. Tinha sido promovido a sargento. A admiração um pelo outro é recíproca.

XXV – Conclusão Feliz.

Depois do luto, Leonardo e Luisinha recomeçam o namoro. Os dois querem casar-se, mas há uma dificuldade: Leonardo era soldado, e soldado não podia casar. Levaram o problema ao Major, que vivia com Maria Regalada. Esse fora o preço pela soltura do Leonardo.

Por influência da mulher, o Vidigal logo arranjou um jeito: dar baixa em Leonardo como tropa de linha e nomeá-lo “Sargento de Milícias”.

Leonardo pai entrega ao filho a herança que lhe deixara o padrinho barbeiro. Leonardo e Luisinha casam-se. E agora aparece “o reverso da medalha”:

“Seguiu-se a morte de D. Maria, a do Leonardo-Pataca, e uma enfiada de acontecimentos tristes que pouparemos aos leitores, fazendo aqui ponto .final.”

Personagens:

Leonardo: filho de Leonardo Pataca e Maria da Hortaliça; protagonista, é o anti-herói, porém possui gestos generosos;

Leonardo Pataca: um meirinho muito sentimental;

Major Vidigal: temido por todos, fazendo com que se cumpra as leis e executando as sentenças por conta própria;

Maria das hortaliças: mãe de Leonardo, uma saloia (camponesa);

Maria Regalada: ex-amante do Major Vidigal;

Luisinha: afilhada de Maria Regalada, primeiro amor de Leonardo, era feia e pálida;

Vidinha: o oposto de Luisinha, a nova paixão de Leonardo após o casamento de Luisinha;

Cigana: desperta paixão em Leonardo Pataca (o pai);

José Manuel: um mau caráter, um caçador de dotes;

Tomás da Sé: amigo de Leonardo;

Organização Estrutural

Para Mário de Andrade, Memórias de um Sargento de Milícias trata-se de uma novela picaresca de influência hispânica.

Manuel Bandeira, em uma de suas crônicas, conta que o grande escritor espanhol Francisco Ayala leu a novela e, de tão encantado, traduziu-a para o espanhol e escreveu no prefácio a palavra que melhor lhe pareceu qualificá-la: obra-prima, acrescentando que As Memórias se inserem na linhagem dos romances picarescos. E olhe que Ayala é da terra da ficção picaresca. Ninguém, pois, melhor qualificado para conferir a láurea.

Não obstante, o nosso pícaro tem características próprias, que o afastam do modelo espanhol, como ressalta o critico Antônio Cândido, m “Dialética da Malandragem”: “Digamos então que Leonardo não é um pícaro saído da tradição espanhola, mas sim o primeiro grande malandro que entra na novelística brasileira, vindo de uma tradição folclórica e correspondendo, mais do que se costuma dizer, a certa atmosfera cómica e popularesca de seu tempo, no Brasil.

Frequentemente identificadas por suas profissões e caracteres fisicos, as personagens se enquadram na categoria de planas, não apresentando, portanto, traços psicológicos densos e profundos. O protagonista da estória (Leonardo), que foge completamente aos padrões de herói romântico, é igualmente uma personagem plana, sem traços psicológicos profundos que marquem a sua personalidade.
Assim, pois, predomina sempre o sentido visual e não a percepção psicológica. Os personagens distinguem-se pelo físico de absoluta nitidez, não falam, e algumas figuras ficam mudas quase todo o tempo, como acontece com Luisinha e o próprio Leonardo.

Na construção da obra, muitas vezes há falhas que se explicam devido ao fato de o livro ter sido escrito em meio à algazarra de uma república de estudantes, como testemunha o biógrafo de Manuel Antônio, Marques Rebelo:

a) A amante de Leonardo pai, na primeira parte, figura como sobrinha da parteira; na segunda, aparece como filha desta.

b) Por outro lado, os primos de Vidinha inicialmente eram três e no final só aparecem dois.

c) A moça cujo rapto foi atribuído a José Manuel aparece como filha de uma viúva, mas, pouco depois, o mesmo José Manuel foi salvo graças ao pai da rapariga.

d) Ao contrário do que ocorre nas obras de “memórias”, aqui a narrativa não é feita em primeira pessoa como acontece geralmente com esse gênero literário, mas em terceira pessoa; talvez porque não se trata realmente de um livro de memórias.

e) Para Paulo Rónai, que traduziu a obra para o francês, o título deveria ser: “Como se Faz um Sargento de Milícias, pois, segundo confessa, teve tentação de colocar, como titulo, na tradução francesa -“Comment on devi ent un Sargent de la Mi/ice ‘. Já para Olívio Montenegro, o título poderia ser: “Cenas da Vida Carioca”.

Estilo de Época

Tendo surgido em pleno Romantismo, Memórias de um Sargento de Milícias apresenta uma narrativa desembaraçada, com conversações colhidas ao vivo e uma multidão de personagens vivos, extraídos da gente do povo, primando pela originalidade.

Entretanto, podem-se detectar, na obra, aspectos que traem não só o Romantismo como o Realismo:

1) Não parece ser muito apropriado considerar o livro como obra precursora do Realismo no Brasil, embora seu autor haja revelado conhecer a “Comédia Humana”, de Balzac, e ter recebido influências dela.

Falta-lhe, sem dúvida, a intenção realista, apesar da presença de muitos elementos denunciadores desse estilo de época, como ressalta José Verissimo: “o autor pratica, no romance brasileiro, o que já é licito chamar obra psicológica e de meio: a descrição pontual, a representação realista das coisas, mas fugindo às cruezas.

2) Ao contrário do que ocorre no Romantismo, o cenário não é o dos palácios reais com festas e diversões ao gosto dos nobres, nem a natureza; são as ruas cheias de gente, por onde desfilam meirinhos, parteiras, devotas, granadeiros, sacristães, vadios, brancos, pardos e pretos: gente do povo, de todas as raças e profissões. Povo sem nome, simplesmente designado por mestre de reza, parteira, barbeiro, toma largura, etc. Assim, existe, no livro, uma preocupação documental bem ao gosto realista.

3) Além disso, destacam-se na obra o sentimento antirreligioso e anticlericalista, o horror aos padres e o desprezo pelas beatas, a caricatura e a ironia, que são ingredientes sabidamente caracterizadores do estilo realista:

O Divino Espírito Santo
E um grande folião,
Amigo de muita carne.
Muito vinho e muito pão.

A cena do clérigo, mestre de cerimônias, no quarto de uma cigana prostituta, em noite de festa e nos trajes em que o autor o coloca é digna de mestres do Realismo, como Eça de Queiroz, por exemplo.

Por outro lado, a presença do Romantismo também é notória na obra:

1) A busca do passado, que é uma fixação comum no estilo romântico, serve de ponto de partida para o autor, como se vê na abertura do livro: “Era no tempo do rei”.
Conforme ressalta Paulo Rónai, “orgulha-se o autor de não participar dos exageros românticos, mas, saudoso do passado, explica o interesse pelos tempos antigos com a alegação de querer mostrar que os costumes de outrora não eram superiores aos de seu tempo. Só mero pretexto: ele só não admitia os excessos dos ultrarromânticos.”

2) Como é frequente no Romantismo, que tem, ao lado de uma certa tendência para finais tétricos, propensão para as conclusões açucaradas, todos os capítulos e a própria novela terminam num “happy end ‘, ou final feliz.

3) A despreocupação com a correção gramatical e o aproveitamento da fala e de expressões populares mostram bem a tendência para a liberalização da expressão, que é outra conquista do Romantismo, forjada na esteira do liberalismo da época, como revelam os exemplos abaixo:
A vista disto nada havia a duvidar: o pobre homem perdeu. como se costuma dizer, as estribeiras,…”

“Quando amanheceu, acordou sarapantado….”
“— Olá, Leonardo! Por que carga d ‘água vieste parar a estas alturas? Pensei que te tinha já o diabo lambido os ossos, pois depois daquele maldito dia em que nos vimos em pancadaria, por causa do mestre-de-cerimônias, nunca mais te pus a vista em cima.”
“— Escorropicha essa garrafa que ai resta, disse-lhe o amigo…
Fui para casa de meu pai… e de repente, hoje mesmo. brigo lá com a cuja dele…”
Na onda dessa liberalização, há verdadeiras incorreções gramaticais, conforme atestam estes exemplos:
“Naquela família haviam três primos.”
Nas causas de sua imensa alçada não haviam testemunhas…”
“…ele expôs-me certas coisas… e que eu enfim não quis dar crédito.”
“… Fazia o mestre em voz alta o pelo-sinal. pausada e vagarosamente, no que o acompanhava em coro todos os discípulos.”

4) Como é comum no Romantismo, algumas situações são criadas artificialmente. Revela-o sobretudo o fato de Leonardo transformado em granadeiro e posteriormente em Sargento de Milícias.

Assim, embora apresente características que lembram os estilos realista e romântico, Memórias de um Sargento de Milícias se destaca por sua originalidade, afastando-se dos padrões da época, como observou Mário de Andrade, que considerava essa novela uma obra isolada.

Linguagem

1) A linguagem utilizada pelo autor em toda a novela, embora de cunho popular e com bastantes incorreções, tem muito do linguajar tipicamente português, o que revela, sem dúvida, a marcante presença da gente lusitana em nossa terra no “tempo do rei”:

“Não quero cá saber de nada…”
“— Pois estoure, com trezentos diabos!”
“… há de ser um clérigo de truz.”
“… regulando-se a ouvir modinhas…”
“— E a noiva?.., respondia a outra: arrenego também da lambisgoia…”

E outras expressões como tira-te lá, tranco-te essa boca a socos; mais pequena, com a cuja dele, etc.

2) Outras vezes prima por usar construções bem clássicas:

“… o que o distinguia era ver-se-lhe constantemente ./ora de um dos bolsos, o cabo de uma tremenda palmatória,…”
Coimbra era a sua ideia fixa, e nada /ha arrancava da cabeça.”
“… e quando tiver 12 ou 14 anos há de me entrar para a escola.
“… e isto era natural a um bom português, que o era ele.”

3) A ironia e o gosto pela gozação acompanham a obra Memórias de um Sargento de Milícias do começo ao fim.

“A carruagem era um formidável, um monstruoso maquinismo de couro, balançando-se pesadamente sobre quatro desmesuradas rodas. Não parecia coisa muito nova; e com mais de dez anos de vida poderia muito bem entrar no número dos restos infelizes do terremoto, de que fala o poeta.

Luisinha, conduzida por D. Maria, que lhe ia servir de madrinha, embarcou num dos destroços da arca de Noé. a que chamamos carruagem; “

Entre os honestos cidadãos que nisto se ocupavam, havia, na época desta história um certo Chico-Juca. afamadíssimo e temível.”

Eis aqui como se explica o arranjei-me, e como se explicam muitos outros que vão ai pelo mundo.