Cultura

Influência negra na cultura brasileira

Com muita dificuldade, os negros africanos trazidos como escravos procuraram manter seus valores culturais e preservar suas tradições culturais.

A cultura dos africanos foi trazida para o Brasil há muitos anos pelos escravos vindos de diversas regiões da África. Com o passar do tempo, a população de descendência africana se expandiu e as relações sociais entre os diferentes povos transformaram o país em um território mestiço e rico em diversidade cultural.

Assim, herdamos desse povo sua cultura, que se transformou e se adaptou à convivência com outras esferas culturais, como a indígena e a europeia.

O povo africano nos trouxe uma rica e milenar cultura, que até os dias de hoje se reflete na nossa sociedade. A influência é notória, por exemplo, na dança, na música, nas religiões de origem africana, na capoeira etc.

Com o tempo, a arte africana se fundiu com a indígena e a europeia. Muitas adaptações foram feitas, dando origem a uma arte afro-brasileira característica de um país rico em diversidade cultural e étnica.

Ritmos e danças

O Samba

No início do século XX, uma mistura de ritmos africanos, capoeira, batuques e pagodes deu base ao que seria o samba. A popularização das rádios entre 1920 e 1930 foi o principal fator a permitir que a música popular brasileira se organizasse e crescesse, ainda que marcada por grande diversidade. Surgem nomes importantes, como Ary Barroso, Noel Rosa, Carmem Miranda, Luiz Gonzaga, entre outros.

A Capoeira

A capoeira é uma mistura de luta, dança e música. Foi inventada por escravos africanos, o que pode ser percebido pelos instrumentos (tambor e berimbau), pelos ritmos, pelas letras das canções, pela formação em roda e pelos passos de dança. Há, atualmente, dois gêneros: capoeira angola e regional.

Na capoeira regional, o “jogo” (luta) entre duas pessoas acontece em uma roda, na qual todos cantam. Os adversários dão golpes com as pernas, a cabeça, as mãos, os cotovelos e os joelhos. O objetivo principal, no entanto, não é atingir o oponente, mas sim demonstrar a superioridade em termos de habilidade. Costuma-se simular os golpes sem completá-los.

Quadro retratando a influência negra na capoeira.
Jogar capoeira ou dança da guerra–Johann Moritz Rugendas, 1835

Hoje, a capoeira é praticada por mais de 10 milhões de pessoas em centenas de países do mundo. Ela é considerada um patrimônio histórico nacional.

O coco de roda

Dentre tantos sons distintos, alguns se originaram da mistura entre as etnias do Brasil, como é o caso do coco de roda, do jongo e do lundu.

O coco de roda tem origem incerta, porém dentre os estados que se encontram como prováveis berços deste ritmo estão Alagoas, Pernambuco e Paraíba. Caracterizado pelo seu estilo particular de dança, o coco de roda pode ser praticado em duplas ou fileiras. A influência africana e indígena tornou o coco um folguedo popular, com letras de músicas que falam sobre a natureza e a vida cotidiana.

As canções são acompanhadas por instrumentos de percussão como o pandeiro, o ganzá e o surdo, e uma marcação realizada pela batida ritmada das palmas das mãos. A cantora pernambucana Selma do Coco e o grupo Coco Raízes de Arcoverde são referências deste ritmo.

O jongo

De origem africana, o jongo é um ritmo que influenciou diretamente o surgimento do samba carioca.

Trazido pelos escravos africanos, o jongo brasileiro tem características que variam de região para região. Apesar disso, a maior parte das canções evoca as crenças africanas, de modo que explora contextos religiosos e místicos.

O canto é acompanhado de pandeiro, viola, tambores e berimbau. Por sua vez, a dança evolui como um tipo de jogo em que são feitos desafios entre os jongueiros.

O lundu

Como um ritmo afro-brasileiro, o lundu é uma dança sensual. Criado a partir do batuque dos africanos mesclado com alguns ritmos portugueses, o lundu se desenvolve com movimentos ondulares e é executado por flautas, tambores e alguns instrumentos de cordas, como o bandolim, quase sempre ignorando o canto.

Com seu caráter jocoso e sensual, o lundu foi um dos primeiros ritmos aceitos pelos europeus que viviam no Brasil, tanto que chegaram até mesmo a produzir alguns festivais no século XIX. Com o tempo, a dança e a música receberam adaptações, o que levou ao surgimento de outros ritmos, como o maxixe, que, segundo especialistas, deu origem a um terceiro ritmo, o samba, no século XX.

O lundu, com algumas modificações, ainda é praticado em algumas regiões do país, como no Pará, onde recebeu o nome de lundu marajoara, por ter sua origem na ilha de Marajó.

Enfim, são muitos os ritmos brasileiros e, como toda manifestação artística, a música se adapta às mudanças da sociedade. São essas mudanças que revigoram e transformam a cultura do Brasil em uma das mais originais do planeta.

Religião

Candomblé e umbanda são duas das religiões denominadas afro-brasileiras. Ambas têm como característica a organização em pequenos grupos que se reúnem em tomo de um pai ou uma mãe-de-santo, em espaços conhecidos por terreiros. Apesar da origem africana e de algumas semelhanças nos cultos, são duas religiões diferentes.

O candomblé chegou ao Brasil com o tráfico de escravos negros iorubá vindos da Nigéria; jejes, da costa de Daomé; e bantos, do sudoeste africano, entre os séculos XVI e XIX. A religião está ligada a elementos da natureza que são representados por divindades, os orixás, que têm cada um deles o seu dia, a sua cor, a sua comida e as saudações específicas.

Considerado bruxaria, o candomblé sofreu com a perseguição da polícia e dos portugueses. Para escapar da pressão dos colonizadores, seus adeptos passaram a associar os orixás a santos católicos. O candomblé estabeleceu-se primeiro na Bahia e de lá se disseminou por todo o país.

A umbanda é mais recente, tem origem no Rio de janeiro e as primeiras manifestações datam da década de 1920. Ela incorporou rituais do candomblé, do catolicismo e também do espiritismo kardecista, e por isso é considerada uma religião popular e mais brasileira.

Na umbanda, os orixás têm papel de destaque assim como no candomblé, e algumas saudações e práticas religiosas são parecidas, mas nela prevalecem as entidades espirituais chamadas guias, que se comunicam, como pombajiras, caboclos e pretos-velhos, por meio dos médiuns.

Linguagem

Sem dúvida, a língua portuguesa recebeu enorme influência das línguas africanas. As línguas angolanas de origem banta (quicongo, quimbundo e umbundo) foram as que mais influenciaram o linguajar brasileiro, pois milhões de escravos vieram da região de Angola.

Algumas palavras de origem banta: bunda, caçula, cachaça, cochilar, marimbondo, moleque, quindim, quilombo, quitanda, samba, sunga e xingar. tam-ém foram importantes as línguas faladas pelos ewe-fon (ou mina-jeje) em Minas Gerais e pelos nagô-iorubás na Bahia.

Segundo alguns linguistas, a diferença de pronúncia entre o português falado no Brasil e em Portugal deve-se ao processo de africanização e indigenização da língua falada aqui. Vale notar que, apesar do processo de interação linguística, a língua portuguesa falada pelo colonizador prevaleceu sobre os dialetos africanos e indígenas.

Culinária

Os escravos não tinham como reproduzir no Brasil os mesmos hábitos alimentares que possuíam na África. Por isso, incorporaram muitos alimentos e práticas já existentes, o que possibilitou a invenção de inúmeros pratos. Mesmo assim, eles mantiveram alguns dos seus antigos costumes, como a intensa utilização da pimenta vermelha, do azeite de dendê e do quiabo.

Após a abolição, as comunidades afro-brasileiras mantiveram sua criatividade. Na Bahia, pratos como vatapá, sarapatel, moqueca, bobó e acarajé foram criados dentro da tradição culinária afro. Algumas receitas, inclusive, faziam parte de cerimônias do candomblé.

Hoje o ofício das baianas do acarajé da Bahia é considerado patrimônio nacional devido à sua importância para a cultura brasileira. Sobre a feijoada, acredita-se que tenha sido inventada pelos escravos. Há, no entanto, pesquisadores que discordam dessa versão, pois sabe-se que o prato também era apreciado pela elite.

Bonecas abayomi

A oralidade afro-brasileira nos conta que, na época em que os africanos foram trazidos para o Brasil como escravos, muitas mulheres estavam grávidas ou eram trazidas com seus filhos ainda crianças. Para trazer alguma alegria de forma modesta durante o trajeto nos navios negreiros, as mulheres escravizadas rasgavam suas vestes e, com nós em pequenos retalhos, criavam bonecas para seus filhos.

As bonequinhas de pano receberam o nome de abayomi, nome de origem africana que significa encontro precioso. Como singelos presentes, as bonecas abayomis representam aquele, ou aquela, que traz felicidade.

Conclusão

A preservação da cultura negra significava a luta diária pela sobrevivência. Embora ameaçados pelo cativeiro, proibidos de praticar os seus ritos, vítimas de violência e separação física entre pessoas do mesmo grupo familiar, eles continuaram lutando pela manutenção de seus valores culturais.

Por: Wilson Teixeira Moutinho

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