História

Causas da Revolução Francesa

Um dos maiores acontecimentos da entrada na contemporaneidade foi a Revolução Francesa. Sua eclosão consistiu no colapso do chamado Antigo Regime europeu, em que a ordem absolutista foi colocada em xeque, juntamente com uma sociedade de princípio nobiliárquico e com um sistema tributário que atingia duramente o Terceiro Estado francês.

As causas da Revolução Francesa podem ser descritas com base em uma reflexão sobre a dimensão política, econômica, social e cultural do país.

Causa política

A França do século XVIII atravessava grandes problemas. A má gestão da coroa fazia crescer a dívida do país, contudo aumentavam a desigualdade e a produção.

Anos infelizes abateram a agricultura local e, nas Américas e nos oceanos, derrotas se acumulavam. Franceses perderam grande parte do seu império colonial e agora permaneciam mais do que nunca à sombra dos ingleses, como tinha ficado provado na Guerra dos Sete Anos (1756-1763). A independência norte-americana, apoiada pelos franceses, havia sido uma grande vitória de Pirro – a França simplesmente havia se endividado de uma forma que não podia lidar.

Enquanto isso, na própria França, a crise econômica em conjunção com os péssimos anos da produção agropecuária haviam empurrado a população em direção à fome e à privação. Simplesmente não havia comida. Enquanto isso, a nobreza de Versalhes permanecia indiferente à crise, inclusive vetando cortes de custos que seriam importantes para reverter o quadro nacional.

As ideias iluministas passaram a ser utilizadas como possibilidade de mudança na organização político-institucional, alimentando pensamentos reformadores e revolucionários na política. O ressentimento da poderosa burguesia, de camponeses e até militares começava a infundir os elementos de uma grande revolta no país. O alvo: a nobreza e seus privilégios e a influência da igreja (que também permanecia alheia à fome, no caso do clero).

A Revolução Francesa, em 1789, é um dos pontos mais importantes da história moderna e contemporânea. A partir dessa fagulha, modelos idealizados por grandes pensadores da política seriam aos poucos colocados em prática. Em 1789, foi dado o primeiro passo em direção à criação das democracias modernas.

A Revolução Francesa coincide exatamente com um momento no qual o poder dos monarcas absolutistas europeus estava em seu auge. A Idade Média havia acabado fazia mais de 300 anos, porém em escala nacional, a maioria dos países diferia pouco da lógica de poder absoluto dos suseranos medievais. Principalmente com base no pensamento de Rousseau, franceses mudariam a história e criaram um movimento que, no século seguinte, culminaria na independência de grande parte das antigas colônias europeias nas Américas.

Causa econômica

Boa parte da riqueza da França encontrava-se nas mãos da Igreja e da nobreza, grupos que detinham os privilégios naquela sociedade de ordens. A segunda metade do século XVIII trouxe à população em geral um nível de pobreza apenas comparável ao que a França atravessara durante a Peste Negra e a Guerra dos Cem Anos.

Em contraste, a riqueza ainda existente e a arrecadação de impostos, que nunca cessaram, servia à ostentação e não a uma atividade produtiva que pudesse alavancar a economia francesa. O regime absolutista tornava-se a cada dia uma barreira mais evidente para as reformas econômicas e estruturais que a burguesia cobrava. A nobreza e sua cara administração precisavam ceder lugar a uma estrutura mais barata, que de fato representasse o povo e tomasse decisões no sentido de resolver problemas da economia francesa – não apenas da realeza..

Como se não bastassem tais insatisfações, a realeza havia criado problemas sérios para as finanças do Estado, ao desenvolver políticas de endividamento e belicistas que consumiam seus recursos, sem provocar estímulos consideráveis na atividade econômica do país.

A própria aristocracia e a nobreza “menor” da França já não suportava as medidas reais e a forma como a coroa parecia ignorar a crise sistêmica no país. Sem perceber como isso poderia se voltar contra seu próprio poder, os altos funcionários da coroa e a nobreza regional, organizada, pediria auxílio da aristocracia burguesa no sentido de colocar pressão sobre Luís XVI.

Pressionado, Luís XVI convocou em 1787 uma reunião da chamada Assembleia dos Notáveis – formada principalmente por membros do clero e altos funcionários do governo. A assembleia vetou todas as medidas que responderiam à crise, vendo uma necessidade de abrir mãos dos próprios privilégios. O fracasso da reunião levou Luís XVI, dois anos depois, a convocar então a Assembleia dos Estados Gerais – esta última contava com representantes dos três estados: a nobreza, o clero e a população.

Ocorrida entre maio e junho de 1789, a Assembleia dos Estados Gerais levaria a igreja a um apoio ao Terceiro Estado. Encurralada, a nobreza tentou manobrar de modo a dissolver a Assembleia Nacional forte que agora se formava. Igreja e Terceiro Estado exigiam uma nova constituição – e a coroa não parecia disposta a ceder. Em menos de um mês, a corte de Luís XVI seria derrubada, na Queda da Bastilha.

Causa social

O Terceiro Estado – tecnicamente representantes do povo, mas obviamente constituída de elementos proeminentes da burguesia francesa – tinham remotas possibilidades, é bem verdade, de ascender à nobreza, por meio da compra de títulos que eram constantemente emitidos pela coroa e concediam direitos à hereditariedade.

A ilustração expõe a situação do Terceiro Estado, indicando a exploração por parte do clero e da nobreza.

Assim, alguns poucos ricos conseguiam os benefícios extras experimentados pelas tradicionais famílias nobres francesas – e tornavam esses benefícios eternos em sua linhagem. O pensamento iluminista ajudava a cogitar outro tipo de ordenamento social e trazia uma novidade importante, vinda dos tempos do Renascimento: a ideia de que o status e o poder de um indivíduo deveriam ser originados no seu talento e recursos, ou no mérito pessoal.

Panfletos, jornais e impressos agora espalhavam as novas ideias, revolucionárias no olhar da nobreza, também junto à população em geral – a fome e a pobreza não davam sinais de recuo e as novas ideias iluministas, republicanas e revolucionárias pareciam cada vez mais viáveis e sedutoras.

Causa cultural

O racionalismo enciclopédico iluminista afirmava ideias contrárias ao poder da Igreja, indicando a secularização das relações políticas, econômicas e sociais. Liberdade, igualdade e fraternidade eram estandartes que condiziam com os valores ditos racionais, os quais visavam ao engrandecimento da comunidade humana e à afirmação dos indivíduos em suas potencialidades.

No campo da política e da filosofia, era emergente o conceito do equilíbrio de poderes. O Antigo Regime já havia, quase um século antes, cedido a ideais de equilíbrio de poder perante pressões da burguesia, que financiava muito da ostentação da nobreza. Contudo, na prática, O Terceiro Estado era sempre um figurante diante da união secular entre coroa e clero.

O sucesso da independência norte-americana havia demonstrado a eficácia da república em resolver certos problemas. Especialmente para comerciantes e burgueses que mantinham relações estreitas com as antigas colônias americanas, o modelo dos Estados Unidos podia não ser perfeito, mas colocava o poder nas mãos daqueles que de fato giravam a economia.

O que representou a Revolução Francesa

A Revolução Francesa decreta o fim do absolutismo e do modelo de aliança entre as coroas europeias e a Igreja Católica, destruindo a matriz de poder tal como vinha sendo aplicada desde os tempos medievais e levando à criação de um modelo político no qual os detentores do poder econômico ganhavam crescente participação.

Os ideais republicanos, apagados deste a Antiguidade, voltavam à tona e os elementos que sobravam do feudalismo seriam aos poucos dissolvidos ao longo dos séculos XVIII e XIX. No campo da política, onde a influência da Revolução Francesa se fez mais nítida, ela representa o primeiro passo na criação dos Estados Nacionais e das democracias modernas, e a evolução do modelo dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), em lugar dos antigos três estados, onde a união absolutista entre clero e monarquias eliminava qualquer influência real das demais camadas da sociedade.

Referências:

  • BLUCHE, Frédéric. Revolução Francesa. Porto Alegre: L&PM, 2009.
  • KISER, Edgar; APRIL, Linton. The hinges of history: state-making and revolt in early modern France. American Sociological Review, 67 (6), 889-910, dec. 2022.
  • TULLARD, Jean. História da Revolução Francesa: 1789-99. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989

Por: Carlos Artur Matos

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