História

Conflitos Mundiais Recentes

A expectativa de um mundo pacífico após o término da Guerra Fria se viu frustrada. As novas complexidades geraram multipolaridades econômicas e novos centros de poder no mundo.

Embora ainda ocorram, as guerras interestatais já não são o tipo de confronto armado predominante atualmente no mundo. Por sua vez, proliferaram-se os conflitos internos, como guerras civis violentas de cunho étnico, religioso ou político, bem como atos e atentados de grupos ligados ao terrorismo.

Além de não trazer a paz, o final da Guerra Fria também não resultou em desarmamento. Ao contrário, diversos países da antiga órbita soviética passaram a atuar mais intensamente no comércio mundial de armas. Neste quadro, reforçou-se a posição relativa dos Estados Unidos, eventualmente posta em questão pela Rússia — ambos ainda detêm gigantescos arsenais nucleares e convencionais. São também os dois maiores vendedores de armas do planeta.

A pesquisa e o desenvolvimento no setor bélico levaram à sofisticação dos armamentos e equipamentos, agora associados aos notáveis progressos da informática e das telecomunicações — colocadas a serviço tanto dos exércitos e dos Estados maiores como de grupos extremistas diversos.

Conflitos mundiais recentes:

UMA GEOGRAFIA DO TERROR

Os atentados e outras ações violentas de organizações do terror são cada vez mais comuns no mundo atual. Um marco nesse tipo de ação foi o atentado às Torres Gêmeas em Nova York (EUA), em setembro de 2001.

Naquela oportunidade, aviões de passageiros foram dominados e lançados contra os prédios. No mesmo dia e no mesmo país, instalações da inteligência militar do Pentágono, em Washington, também foram atacadas.

Ambas as ações foram reivindicadas pela Al-Qaeda, organização comandada à época por Osama Bin Laden — um saudita wahabita (seita que pretende purificar o Islã, retornando às raízes da religião). Bin Laden lutou contra a invasão do Afeganistão por tropas soviéticas, lado a lado com soldados locais e dos Estados Unidos.

O atentado às Torres Gêmeas deixou um saldo de quase três mil mortos, quase todos civis, e desencadeou uma ofensiva dos Estados Unidos, então governado por George W. Bush, com bombardeios a supostas bases terroristas no Afeganistão e no Iraque.

Outro grupo é o Boko Haram, atuante no noroeste da Nigéria, no continente africano. Seu nome significa “a educação não islâmica é pecaminosa” na língua hausa, falada naquela região. Declarando ser um braço da Al-Qaeda na África Ocidental, teve como ação mais notória o sequestro, em 2014, de aproximadamente 200 adolescentes que, segundo o grupo, recebiam educação “ocidental”.

Os atentados são constantes em embates e conflitos internos, como os ocorridos no Paquistão e no Iraque, em conflitos no Cáucaso ou no embate histórico entre israelenses e palestinos. Parte desses atentados é resultado da ação de jihadistas (originário da expressão jihad, que significa guerra santa aos inimigos do Islã), que são extremistas islâmicos que atacam alvos diversos tanto em cidades do Ocidente como no Oriente Médio e no subcontinente indiano.

Assim como no ataque às Torres Gêmeas em 2001, outras ações de grupos do terror se voltam contra valores e ícones ocidentais, como sedes de jornais, estações de metrô e estabelecimentos comerciais, e até mesmo contra símbolos de civilizações da Antiguidade, como a destruição de estátuas assírias no Iraque promovida por membros do Estado Islâmico (EI), em 2015.

Entre as ações de grande violência ou elevado número de mortos e feridos estão as ocorridas em uma estação de trem de Madri (Espanha), em 2004, e os ataques simultâneos a casas de shows, restaurante e estádio de futebol, em Paris, em novembro de 2015.

As ações desses grupos têm sido fortemente condenadas por religiosos e lideranças islamitas, que contrapõem à violência dos atentados a mensagem de paz contida nos livros sagrados da religião muçulmana. Portanto, embora muitos queiram disseminar essa imagem, não há relação direta entre islamismo e terrorismo.

Um dado importante a considerar é que os grupos do terror possuem estratégias espaciais que tornam mais difícil o combate às suas ações. Em geral, utilizam frações de diversos territórios para treinamentos militares ou para alocar militantes sem vínculos com governos ou lideranças políticas.

Valem-se das telecomunicações modernas, típicas da globalização, para recrutar adeptos ou planejar e organizar ações. Desse modo, formam-se grupos pequenos e ágeis, que atuam em redes geográficas — combatidos por forças militares de base territorial. E, não raro, com respostas inócuas.

CONFLITOS NO ORIENTE MÉDIO

O Oriente Médio, região da Ásia que envolve a península Arábica, o Golfo Pérsico e territórios da orla do Mediterrâneo e da Ásia Central, é um berço de culturas milenares e das três grandes religiões monoteístas (cristianismo, islamismo e judaísmo). Já foi palco de inúmeras conquistas territoriais e domínio de impérios e califados.

As disputas pelas grandes reservas de petróleo e dissenções culturais e religiosas (sobretudo as que opõem xiitas e sunitas) tornam a região uma das mais conturbadas do mundo  recente, com diferentes conflitos, atentados, êxodos de refugiados e perdas de vidas humanas.

A presença de tropas, bases militares e a ajuda financeira de potências ocidentais e da Rússia reforçam a importância estratégica do Oriente Médio.

A GUERRA NA SÍRIA E O ESTADO ISLÂMICO

O surgimento do grupo Estado Islâmico (EI) está associado tanto às divisões entre xiitas e sunitas como a recentes episódios no mundo árabe-muçulmano.

Em 2010, um vendedor de frutas na Tunísia ateou fogo ao próprio corpo para protestar contra extorsão praticada por policiais. Foi o estopim da Primavera Árabe, movimento pautado por intensas manifestações e revoltas populares que sacudiu o norte da África e o Oriente Médio.

Os manifestantes provocaram a queda de mandatários na Tunísia, Egito, Líbia e Iêmen. Atingiram também Argélia, Marrocos, Bahrein, Omã e a Síria e, com menor intensidade, também a Jordânia, Arábia Saudita, Irã, Iraque e Kuwait.

Na Síria, as revoltas desencadearam uma guerra civil a partir de 2011, opondo insurgentes e o governo de Bashar-Al-Assad. De acordo com a ONU, mais de 400 mil pessoas já foram mortas e outros 4,5 milhões imigraram para países europeus na condição de refugiados.

Os primeiros formaram-se de um leque de facções apoiadas pela Arábia Saudita e Ocidente e, numa aliança inusitada, contando com ativistas ligados à Al Qaeda.

O regime de Assad teve o apoio da corrente alauíta, de orientação xiita e à qual pertence a família do governante, de minorias cristãs e de países como Rússia, China e Irã (este, de maioria xiita). Divisões religiosas ajudam a explicar o fato de sauditas e governo sírio estarem em lados opostos.

A guerra civil síria e as fragilidades do Iraque, abalado por guerras, pela presença estadunidense e atentados e agressões entre sunitas e xiitas formaram o cenário ideal para o surgimento do Estado Islâmico. Composto por sunitas extremistas de várias origens, milícias e ex-combatentes de diferentes nacionalidades, e jovens europeus recém convertidos ao islamismo, o grupo rapidamente conquistou frações dos territórios do Iraque e da Síria.

Ocuparam cidades importantes, como Raqa e Palmira (Síria), e Mossul (Iraque). Proclamaram um califado (sucessão, em árabe), regime comandado por um califa, chefe da nação e alçado a sucessor do profeta Maomé. Neste califado moderno do EI, Abu Bakr al-Baghdadi foi nomeado “califa de todos os muçulmanos”.

A certa altura, sobretudo em 2014, o EI chegou a incorporar em suas fileiras mais de 20 mil estrangeiros, oriundos de mais de 50 países.

Segundo o Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur), dados de 2015 registram que 4 milhões de sírios saíram do país por causa dos conflitos. Parcelas foram para países vizinhos; outros tentaram chegar à Europa, em percursos e travessias muito arriscados. Outros 7,6 milhões de sírios deslocaram-se dentro do país, passando a viver em condições precárias. Retornaremos a esse ponto mais adiante.

A partir de 2015, gradativamente o EI passa a perder territórios, em especial no Iraque — que passou a contar com a ajuda de bombardeios aéreos estadunidenses. O mesmo se deu com os avanços das tropas sírias, com apoio russo. Nas fronteiras ao norte, as perdas se deveram a investidas da Turquia, que combinou o combate ao EI com ataques a grupos da minoria curda.

Um acordo para o cessar-fogo entre as tropas de Bashar al-Assad e os grupos que a ele se opõem, imposto por EUA e Rússia em setembro de 2016, pode concentrar a partir daí esforços para combater o EI na Síria.

O CONFLITO ENTRE PALESTINOS E ISRAELENSES

Para compreender a difícil questão palestina, é necessário relembrar que a região onde atualmente se encontra o Estado de Israel e a nação Palestina, na era cristã, encontrava-se sob domínio dos romanos, que expulsaram o povo judeu que se dispersou por diversos países, principalmente europeus. Após a ocupação romana, essa região, denominada Palestina, foi ocupada por povos de origem árabe, que ficaram conhecidos como palestinos.

No final do século XIX, começou a se formar o movimento sionista, que tinha como principal objetivo a criação de um Estado judeu. Após o holocausto, quando nazistas exterminaram milhões de judeus, as comunidades judaicas passaram a se organizar na tentativa de criar um Estado em um território que os protegesse. Desta demanda nasceu o Estado judaico de Israel, que seria a colônia britânica no Oriente Médio, chamada de Palestina.

Surgiu, então, a Organização das Nações Unidas (ONU) — criada em 1945, após a Segunda Guerra Mundial —, a qual encerrou o mandato britânico na região e propôs, em 1947, um plano de partilha da região em dois Estados: um para o povo judeu e outro para o palestino. Em 14 de maio de 1948, criou-se o Estado de Israel.

O plano de partilha não foi aceito pelos países árabes da região, que reagiram imediatamente, provocando o início da primeira das inúmeras guerras que viriam. Era a primeira guerra árabe-israelense ou Guerra da Independência, de 1948 a 1949, que terminou com a vitória das forças israelenses, provocando um grande número de refugiados palestinos que se abrigaram nos países árabes da região, despertando uma unidade em torno desses países contra o Estado de Israel.

A partir disso, a região da Palestina passou a ser o palco de sangrentas guerras e inúmeros acordos não cumpridos entre esses povos.

A questão palestina é complexa, pois tanto judeus quanto palestinos julgam possuir direitos históricos na região. Os judeus tiveram a concretização do seu Estado. O mesmo não aconteceu com os palestinos, que, desde 1948, lutam pela criação de um Estado nacional.

Inúmeros fatores adiam essa conquista, entre eles a dificuldade para definir os limites do território palestino, uma vez que Israel lhes dá a totalidade da Faixa de Gaza, mas não a totalidade da Cisjordânia, onde está o Rio Jordão, principal fonte de água para os israelenses, além da presença de assentamentos de colonos judeus.

Outro caso a considerar é o de Jerusalém: na porção oriental habitam os árabes e na ocidental, os judeus. A cidade é considerada sagrada para muçulmanos, cristãos e judeus, daí a dificuldade nas negociações, pois tanto judeus quanto palestinos reivindicam Jerusalém como sua capital.

O DRAMA DOS REFUGIADOS

Dados da Acnur registram 12,5 milhões de novos refugiados e deslocados no mundo apenas em 2015. Desse total, 8,6 milhões se deslocavam no próprio país. Ao final de 2017, a estimativa total de vítimas de deslocamento forçado era de 65,6 milhões.

Não é difícil imaginar a procedência desses novos contingentes: 54% eram da Síria (4,5 milhões), Afeganistão (2,7 milhões) e Somália (1,1 milhão). Muitos deles procuraram se abrigar em países e outros buscavam destinos que não são difíceis de imaginar: a Europa, sobretudo a Alemanha.

Os novos conflitos no mundo e o consequente aumento no número de refugiados têm exigido respostas e decisões rápidas, mas é possível observar resistências variadas, ao lado de xenofobia e intolerâncias diversas — em especial nos países ricos (EUA e parte da Europa Ocidental). De outro lado, países em desenvolvimento são os que mais abrigam refugiados; por essa razão, solicitam apoio financeiro do mundo rico.

Entre os que mais abrigaram refugiados no período estão países fronteiriços às zonas de conflito: Turquia (2,5 milhões de pessoas), Paquistão (1,6 milhão), Líbano e Irã (ambos receberam cerca de 1 milhão de pessoas). Houve também cerca de 2 milhões de pedidos de asilo em 2015, em especial a países como Alemanha, Estados Unidos, Suécia e Rússia.

OUTROS CONFLITOS E DESAFIOS NO MUNDO ATUAL

O final da Guerra Fria, como vimos até aqui, não representou o término de tensões e conflitos políticos, disputas territoriais e confrontos armados. Com efeito, o novo milênio trouxe muitos desafios para a comunidade de nações e para organizações multilaterais, como a ONU.

Entre os desafios a enfrentar estão os conflitos, hostilidades ou ações armadas em países da África, como Mali, Somália, Egito, Etiópia, Sudão do Sul e o caso ainda dramático da República Democrática do Congo. (Aprenda mais em: Conflitos na África).

Do mesmo modo, resta a questão do reconhecimento de Kosovo como nação soberana, a resolução de conflitos no Cáucaso (guerras civis, separatismos e conflitos étnico-nacionais na Armênia, Azerbaijão, Geórgia e diversas regiões e comunidades autônomas) e ações mais decisivas para o controle do terror no Afeganistão, Paquistão, Iraque e outros pontos do Oriente Médio.

Separatismos e questões nacionais ainda precisam ser dirimidas no Quebec (Canadá), Catalunha (Espanha), País Basco (Espanha/França), Escócia (Reino Unido) e a complexa situação do Tibete (ocupado pela China em 1950).

Merece atenção especial a situação da Ucrânia, que enfrenta protestos e tentativas de cisão territorial de minorias russas apoiadas pelo governo da Federação Russa.

Os circuitos e redes ilegais também demandam ações e políticas decisivas dos Estados nacionais e da comunidade internacional. Situações dramáticas de violência associadas ao tráfico de drogas têm sido registradas no México, Afeganistão, Brasil e EUA. Esta grande potência também enfrenta o desafio de conter a violência social permitida pela posse de armas de fogo, que estão na base de mortes e assassinatos em série em escolas e outros espaços públicos.

O comércio ilegal de armas e o tráfico de seres humanos ainda exigem ações mais concatenadas entre países e organizações de cooperação regional. Um caso que chama a atenção é o tráfico de mulheres do Leste europeu para a Europa Ocidental e de países da América Latina também para a Europa Ocidental.

Por: Wilson Teixeira Moutinho

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