Bioquímica

Metabolismo de Lipídios

Os triagliceróis são os lipídios mais abundantes da dieta e constituem a forma de armazenamento de todo o excesso de nutrientes, quer este excesso seja ingerido sob a forma de carboidratos, proteínas ou dos próprios lipídios.

Representam, portanto, a principal reserva energética do organismo, perfazendo, em média, 20% do peso corpóreo, o que equivale a uma massa 100 vezes maior do que a do glicogênio hepático.

Os triagliceróis  são armazenados nas células adiposas, sob forma anidra, e podem ocupar a maior parte do volume celular.

DEGRADAÇÃO DE TRIAGLICERÓIS E ÁCIDOS GRAXOS

A mobilização do depósito de triagliceróis é obtida por ação de lipases, presentes nos adipócitos, que hidrolisam os triacilgliceróis a ácidos graxos e glicerol, oxidados por vias diferentes.

O glicerol não pode ser reaproveitado pelos adipócitos, que não têm glicerol quinase, sendo então liberado no sangue. No fígado, por ação da glicerol quinase, é convertido a glicerol 3-fosfato e transformado em diidroxiacetona fosfato, um intermediário da glicose ou da gliconeogênese.

O gliceros não pode ser reaproveitado pelos adipócitos, que não têm glicerol quinase, sendo então liberado no sangue. No fígado, por ação da glicerol quinase, é convertido a glicerol 3-fosfato e transformado em diidroxiacetona fosfato, um intermediário da glicólise ou da glicogênese.

Metabolismo de Lipídios

Os ácidos graxos liberados pelos adipócitos são transportados pelo sangue ligados à albumina e utilizados, principalmente pelo fígado e músculos, como fonte de energia. Sua degradação, como se verá a seguir, é feita por uma via especial, que se processa no interior das mitocôndrias.

Para sua oxidação, os ácidos graxos são ativados e transportados para a matriz mitocondrial

Em uma etapa que precede sua oxidação, as ácidos graxos são ativados por conversão a acil-CoA, por ação de acil-CoA sintetases, presentes na membrana externa da mitocôndria.

Nesta reação, forma-se uma ligação tioéster entre o grupo carboxila do ácido graxo e o grupo SH da coenzima. A, produzindo uma acil-CoA. As acil-CoA, como a acetil-CoA, são compostos ricos em energia: a energia derivada da clivagem do ATP em adenosina monofosfato (AMP) e pirofosfato inorgânico (PPi), com a quebra de uma ligação anidrido fosfórico, é utilizada para formar a ligação tioéster. O pirofosfato é hidrolisado a 2 Pi, numa reação irreversível, o que torna o processo de ativação do ácido graxo a acil-CoA também irreversível.

A membrana interna da mitocôndria é impermeável a coenzima A e a acil-CoA. Para a introdução dos radicais acila na matriz mitocondrial, é utilizado um sistema específico de transporte na face externa da membrana interna, a carnitina-acil transferase I transfere o radical acila para a carnitina, e, na face interna, a carnitina-acil transferase II doa o grupo acila da acil-carnitina para uma coenzima. A da matriz mitocondrial, liberando a carnitina.

A acil-CoA é oxidada a acetil-CoA, produzindo NADH e FADH2

A acil-CoA presente na matriz mitocondrial é oxidada por uma via denominada b-oxidação no ciclo de Lynen. Esta via consta de uma série cíclica de quatro reações, ao final das quais a acil-CoA é encurtada de dois carbonos, que são liberados sob a forma de acetil-CoA. As quatro reações são:

  1. oxidação da acil-CoA a uma enoil-CoA (acil-CoA b-instaurada) de configuração trans com formação de FADH2;
  2. hidratação da dupla ligação, formando o isômero L da 3-hidroxiacil-CoA;
  3. oxidação do grupo hidroxila a carbonila, com formação de b-cetoacil-CoA e NADH;
  4. quebra da b-cetoacil-CoA por uma molécula de CoA, com formação de acetil-CoA e uma acil-CoA com dois carbonos a menos; esta acil-CoA refaz o ciclo várias vezes, até ser totalmente convertida a acetil-CoA.

A oxidação do ácido palmítico produz 129 ATP

A oxidação completa de um ácido graxo exige a cooperação entre o ciclo de Lynen, que converte o ácido graxo a acetil-CoA, e o ciclo de Krebs, que oxida o radical acetil a CO2.

Em cada volta do ciclo de Lynen, há produção de 1 FADH2, 1 NADH, 1 acetil-CoA e 1 acil-CoA com dois átomos de carbono a menos que o ácido graxo original.

Sempre que o número de átomos de carbono do ácido graxo for par, a última volta do ciclo de oxidação inicia-se com uma acil-CoA de quatro carbonos, a butiril-CoA, e, neste caso, são produzidas 2 acetil-CoA, além de FADH2 e NADH.

O número de voltas percorridas por um ácido graxo até sua conversão total a acetil-CoA dependerá, naturalmente, do seu número de átomos de carbono. Assim sendo, para a oxidação completa de uma molécula de ácido palmítico, que tem 16 átomos de carbono, são necessárias sete voltas no ciclo, com a produção de 8 acetil-CoA. A oxidação de cada acetil-CoA no ciclo de Krebs origina 3 NADH, 1 FADH2 e 1 GTP. Pela fosforilação oxidativa completa do formam, respectivamente, 3 e 2 ATP. A produção de ATP formado (131) deve ser descontado o gasto inicial na reação de ativação do ácido graxo, onde há conversão de ATP e AMP + 2Pi e, portanto, consumo de duas ligações ricas em energia, o que equivaleria a um gasto de 2 ATP. O rendimento final da oxidação do ácido palmítico será, então, 129 ATP.

A b-oxidação dos ácidos graxos com número ímpar de átomos de carbono produz Propionil-CoA, que é convertida a succinil-CoA

Os ácidos graxos com número ímpar de átomos de carbono constituem uma pequena fração dos ácidos graxos da dieta e são também oxidados pela via da b-oxidação. Neste caso, entretanto a última volta do ciclo de Lynen inicia-se com uma acil-CoA de cinco carbonos e produz uma molécula de acetil-CoA e uma de propionil-CoA, ao invés de duas de acetil-CoA. Para sua oxidação, a propionil-CoA é convertida a succinil-CoA, análoga à carboxilação de piruvato a oxaloacetato e que também requer botina como coenzima. A conversão de D-metilmalonil-CoA a succinil-CoA é feita em duas etapas: transformação do isômero D em L e isomerização deste último composto utilizando 5+-adenosil-cobalamina, um derivado da vitamina B12, como coenzima.

A oxidação de ácidos insaturados também requer enzimas adicionais

Os ácidos graxos insaturados são muito comuns em tecidos animais e vegetais, e suas duplas reações apresentam quase sempre a configuração cis. Para sua oxidação, além das enzimas da oxidação, são necessárias duas enzimas adicionais: uma epimerase é uma isomerase.

Após a remoção de algumas unidades de dois carbonos (acetil-CoA) pelo ciclo de Lynen, o ácido graxo insaturado originará uma D   -enoil-CoA ou uma D  -enoil-CoA, segundo a posição original da dupla ligação no ácido graxo.

A cis-D  -enoil-CoA é substrato para a enoil-CoA hidratase, mas o produto formado é o D-3-hidroxiacil-CoA, ao invés do isômero L, formado na oxidação de ácidos graxos saturados. A etapa seguinte é catalisada pela 3-hidroxiacil-CoA, que só reconhece isômeros L.

Portanto o isômero D deve ser convertido em L por ação de uma epimerase, para seguir as reações subsequentes da b-oxidação.

O fitol, componente da clorofila, é oxidado por alfa e beta-oxidação

A clorofila é um componente quantitativamente importante da alimentação de muitos animais. Um dos substituíntes do núcleo pirrólico da clorofila é o fitol, um álcool com uma longa cadeia alifática, que pode ser oxidado a ácido fitânico, um componente minoritário de gorduras, leite e derivados. O ácido fitânico, por conter um radical metil no carbono b, não é reconhecido pela acil-CoA desidrogenase, que catalisa a primeira reação da b-oxidação. Esta situação é contornada pela hidroxilação do carbono a do ácido fitânico (a-oxidação), seguida por descarboxilação. O ácido pristânico produzido tem o radical metil agora no carbono a e apresenta o carbono b não-substanciado, podendo ser ativado e oxidado pelo ciclo de Lynen. Devido à presença dos radicais metil, a oxidação da pristanoil-CoA produz, alternadamente, propionil-CoA.

A deficiência hereditária de enzima que promove a a-oxidação resulta em acúmulo de ácido pristânico no sangue e nos tecidos, com lesão do sistema nervoso central (moléstia de Refsum)

No fígado, a acetil-CoA pode ser convertida a corpos cetônicos, oxidados por tecidos extrahepáticos

No fígado, uma pequena quantidade de acetil-CoA é normalmente transformada em  acetoacetato b-hidroxibutirato. Estes dois metabólitos e a acetona, formada espontaneamente pela descarboxilação do acetoacetato, são chamados em conjunto de corpos cetônicos, e sua síntese, de cetogênese. Esta ocorre na matriz mitocondrial, através da condensação de três moléculas de acetil-CoA em duas etapas. Na primeira, catalisada pela tiolase, duas moléculas de acetil-CoA originam acetoacetil-CoA. Esta reação, quando transcorre no sentido oposto, constitui a última reação da última volta do ciclo de Lynen. A reação de acetoacetil-CoA com uma terceira molécula de acetil-CoA forma 3-hidroxi-3-metilglutaril-CoA (HMG-CoA). Sua clivagem origina acetoacetato e acetil-CoA. O acetoacetato produz b-hidroxibutirato e acetona.

Os corpos cetônicos são liberados na corrente sanguínea, e o acetoacetato e o b-hidroxibutirato são aproveitados, principalmente pelo coração e músculos, como fonte de energia. Estes órgãos são capazes de utilizar os dois compostos por possuírem uma enzima, a b-cetoacil-CoA transferase, ausente do fígado. Esta enzima catalisa a transferência de CoA de succinil-CoA para acetoacetato, formando acetoacetil-CoA é um intermediário do ciclo de Lynen e, por ação da tiolase, é cindida em duas moléculas de acetil-CoA, que podem ser oxidadas pelo ciclo de Krebs. O aproveitamento do b-hidroxibutirato é feito por sua prévia transformação em acetoacetato, através da ação da b-hidroxibutirato desidrogenase.

A produção de corpos cetônicos é, portanto, um processo que permite a transferência de carbonos oxidáveis do fígado para outros órgãos. Esta produção é anormalmente alta quando a degradação de triagliceróis aumenta muito sem ser acompanhada por degradação proporcional de carboidratos. É o que ocorre quando há redução drástica da ingestão de carboidratos (jejum ou dieta) ou distúrbio de seu metabolismo (diabetes). Como a produção ultrapassa o aproveitamento pelos tecidos extrahepáticos (cetose), os corpos cetônicos aparecem no plasma em concentração elevada (cetonemia), levando a uma acidose, isto é, uma diminuição do pH sanguíneo. Em casos de cetose acentuada, o cérebro pode obter parte da energia que necessita por oxidação dos corpos cetônicos.

O etanol é oxidado a acetil-CoA

O etanol ingerido pelo homem é prontamente absorvido e, no fígado, é oxidado a acetaldeído pela álcool desidrogenase citoplasmática, em uma reação idêntica à última etapa da fermentação alcoólica por leveduras:

O equilíbrio da reação favorece a formação de etanol, mas sua oxidação prossegue graças a conversão de acetaldeído em acetato, catalisada pela acetaldeído desidrogenase mitocondrial:

O acetato, à semelhança dos ácidos graxos, origina acetil-CoA por ação da acil-CoA sintetase. Neste ponto, o metabolismo do etanol confunde-se com o metabolismo de carboidratos, lipídios e proteínas, que também originam acetil-CoA. Deste modo, o consumo de quantidade discretas de etanol significa consumo adicional de calorias, que devem ser adicionadas às calorias derivadas na ingestão de nutrientes no cômputo das calorias totais da dieta. Todavia, a ingestão de grandes quantidades de etanol e, principalmente, o alcoolismo crônico têm consequências muito danosas para o organismo.

Alguns efeitos metabólicos do álcool no fígado são resultado da produção de níveis altos de NADH no citossol, onde normalmente a concentração de NAD+ é muito maior do que a de NADH. A alta concentração de NADH resultante da oxidação do etanol desloca a reação catalisada pela lactato desidrogenase no sentido da formação de lactato, cuja concentração pode aumentar de até cinco vezes, levando, portanto, a uma acidose. A baixa concentração de piruvato resultante impossibilita a gliconcogênese. Como, muitas vezes, a ingestão de álcool não é acompanhada de ingestão de nutrientes, pode ocorrer hipoglicemia e, finalmente, coma. A produção de acetil-CoA associada à baixa disponibilidade de glicose ocasiona cetose. Muitos efeitos metabólicos ao etanol ainda são compreendidos, especialmente aqueles que induzem a dependência.

SÍNTESE DE ÁCIDOS GRAXOS E TRIACILGLICERÓIS

Os ácidos graxos, constituíntes dos triacilgliceróis, podem diretamente da dieta ou serem sintetizados a partir de carboidratos, principalmente, e de proteínas. Neste último caso, os carboidratos e os aminoácidos são degradados até acetil-CoA e oxaloacetato. A síntese de ácidos graxos ocorre no citossol, para onde deve ser transportada a acetil-CoA formada em mitocôndria. Da condensação de acetil-CoA e oxaloacetato, forma-se citrato. Se a carga energética celular for alta (alta concentração de ATP), o citrato não pode ser oxidado pelo ciclo de Krebs em virtude da ambição da isocitrato desidrogenase e é transportado para a citossol, onde é cindido em oxaloacetato e acetil-CoA, à custa de ATP, numa reação catalisada pela citrato liase:

O oxaloacetato é reduzido a malato pela desidrogenase málica do citossol. O malato é substrato da enzima málica: nesta reação são produzidos piruvato, que retorna a mitocôndria, e NADPH.

A síntese de ácidos graxos tem malonil-CoA como doador de carbonos e NADPH como agente redutor

A síntese de ácidos graxos consiste na união sequencial de unidades de dois carbonos: a primeira unidade é proveniente de acetil-CoA, e todas as subsequentes, de malonil-CoA, formada por carboxilação de acetil-CoA. Esta reação é catalisada pela acetil-CoA, formada por carboxilação de acetil-CoA. Esta reação é catalisada pela acetil-CoA carboxilase, que tem como grupo prostético a biotina.

A síntese de ácidos graxos em bactérias e mamíferos processa-se através das mesmas reações catalisadas, todavia, por sistemas enzimáticos diferentes. A seguir será descrita a síntese em bactérias e, posteriormente, assinaladas as diferenças entre este sistema e o que ocorre em mamíferos.

Nas bactérias, as enzimas da síntese de ácidos graxos estão agrupadas em um complexo enzimático chamado sintase de ácidos graxos. Também faz parte deste complexo uma pequena proteína não enzimática, designada proteína carregadora de acila, ou ACP (“acyl-carrier protein”), à qual está sempre ligada a cadeia do ácido graxo em crescimento. O ACP tem como grupo prostético um derivado do ácido pantotênico: a  fosfopanteteína, também componente da coenzima A.

A síntese inicia-se com a transferência do radical acetil da CoA para o ACP, catalisada pela primeira enzima do complexo: a acetil-CoA-ACP transacilase; este radical é, a seguir, transferido para o grupo SH de um resíduo de cisteína da Segunda enzima do complexo: a b-cetoacil-ACP sintase. O ACP, agora livre, pode receber o radical malonil da malonil-CoA, formado malonil-ACP. Segue-se uma condensação dos grupos acetil e malonil, catalisada pela b-cetoacil-ACP sintase (enzima de condensação), com liberação de CO2. Este CO2 é exatamente aquele usado para carboxilar a acetil-CoA a malonil-CoA. Por isso, apesar de CO2 ser imprescindível à síntese de ácidos graxos, seu átomo de carbono não aparece no produto. O fato de a condensação processar-se com uma descarboxilação faz com que esta reação seja acompanhada de uma grande queda de energia livre, dirigindo a reação no sentido da síntese. Justifica-se assim o gasto inicial de ATP para produzir malonil-CoA a partir de acetil-CoA: a utilização do percursor de três carbonos contorna a inviabilidade termodinâmica da condensação de duas moléculas de dois carbonos.

A b-cetoacil-ACP de quatro carbonos formada sofre uma redução, uma desidratação e nova redução. As reduções são catalisadas por redutases que usam NADPH como doador de elétrons. Neste ponto termina o primeiro ciclo de síntese, com a formação de um butiril-ACP. Deve-se notar que a sequência das reações de síntese (condensação, redução, desidratação e redução) é inversa à sequência das reações de oxidação de um ácido graxo pelo ciclo de Lynen (oxidação, hidratação, oxidação, quebra da cadeia carbônica). Os processos diferem, entretanto, quanto às enzimas e coenzimas que utilizam, o compartimento celular onde se processam e o suporte da cadeia carbônica (CoA ou ACP).

Para prosseguir o alongamento da cadeia, o radical butiril é transferido para o grupo SH da b- cetoacil-ACP sintase ( à semelhança do que ocorreu com o radical acetil), liberando o ACP, que recebe outro radical malonil. A repetição do ciclo leva à formação do hexanoil-ACP e, após mais cinco voltas, de palmitoil-ACP, que hidrolisado, libera o ácido palmítico.

Nos animais, a sintase de ácidos graxos é composta por apenas duas cadeias polipeptídicas idênticas, formando, portanto, um dímero do tipo a 2. A cada cadeia encontra-se associado um ACP. O que torna notável esta organização é o fato de estas cadeias polipeptídicas constituírem enzimas multifuncionais. Este termo é aplicado para designar cadeias polipeptídicas que apresentam várias atividades catalíticas, cada uma das quais associada a uma certa região da cadeia. Este é exatamente o caso da sintase de ácidos graxos dos animais, que apresentam, em cada cadeia peptídica, as atividades correspondentes às seguintes enzimas bacterianas: acetil-CoA-ACP transacilase, malonil-CoA-ACP transacilase, b-cetoacil-ACP redutase, b-cetoacil-ACP desidratase, enoil-ACP redutase e tioesterase. Esta última atividade é a responsável pela hidrólise final de palmitoil-ACP, liberando ácido palmítico. Uma comparação entre s atividades enzimáticas de cada monômero do complexo e as enzimas necessárias para a síntese de ácidos graxos em bactérias revela a ausência de atividade equivalente à da enzima de condensação (b-cetoacil-ACP sintase) no monômero. De fato, esta atividade só aparece no dímero funcional, pois depende de interações das duas cadeias peptídicas. A presença de enzimas multifuncionais associadas em um dímero traz, naturalmente, grande eficiência e economia ao processo de síntese, permitindo também a síntese simultânea de duas moléculas de palmitato, uma em cada monômero.

No total, a síntese de ácido palmítico (16 C) requer 1 acetil-CoA, 1 malonil-CoA, 14 NADPH e 7 ATP (consumidos na formação de 7 malonil-CoA a partir de 7 malonil-CoA). Os NADPH têm duas origens: proveem da reação catalisada pela enzima málica e das reações da via das pentoses-fosfato catalisadas por desidrogenases. A importância relativa entre essas duas fontes de poder redutor depende do tecido considerado.

O palmitato pode sofrer alongamento e insaturações. Alguns ácidos graxos insaturados são essenciais para os mamíferos

O ácido palmítico pode ser utilizado como percursor para a formação de ácidos graxos mais longos ou insaturados. Os sistemas enzimáticos incubidos dessas modificações situam-se no retículo endoplasmático.

O alongamento processa-se por reações muito semelhantes às da síntese de ácidos graxos. Os ácidos graxos com uma dupla ligação na posição D  são sintetizados por um complexo enzimático que requer NADH e O2 e inclui o citocromo b5, firmemente ligado ao retículo endoplasmático. Este sistema produz os ácidos graxos monoinsaturados mais comuns nos tecidos animais: palmitoleico e  oleico. Nos mamíferos, não há possibilidade de introdução de duplas ligações entre carbonos mais distantes da carboxila do que o C9. Os ácidos linoleico (C18 D) e a-linolênico ( C18 D) são, por isso, essenciais para o homem, isto é, devem ser obtidos pela dieta. A dessaturação adicional do ácido linoleico origina o ácido g-linolênico (C18 D) nos animais e o ácido a-linolênico (C18 D) nas plantas.

O ácido g-linolênico sofre alongamento de dois carbonos que resulta em alterações da posição das insaturações e formação de um intermediário C20 D. A quarta insaturação é introduzida entre os carbonos 5 e 6, originando o ácido araquidônico ( C20 D). Estas vias de dessaturação de ácidos graxos não estão totalmente elucidadas, mas admite-se que o ácido linoleico seja o único ácido graxo essencial para o homem; as necessidades de ácido a-linolênico são, ainda, obscuras.

O ácido araquidônico é percursor das prostaglandinas. As prostaglandinas compõe uma família de substâncias produzidas pela maioria das células dos mamíferos e que, atuando em concentrações tão baixas quanto os hormônios, regulam processos fisiológicos muito diversificados, como agregação de plaquetas, concentração de musculatura lisa, reação inflamatória etc.

Os percursores dos triacilgliceróis são glicerol 3-fosfato e acil-CoA

Os triacilgliceróis são sintetizados a partir de acil-CoA derivadas de ácidos graxos e glicerol 3-fosfato. O glicerol 3-fosfato é formado por redução de diidroxiacetona fosfato: obtida a partir de glicose. No fígado, existe uma via alternativa para obtenção de glicerol 3-fosfato:  a fosforilação do glicerol, catalisada pela glicerol quinase. O glicerol 3-fosfato é acilado em duas etapas, formando fosfatidato, intermediário também da síntese de fosfolipídios. O triaglicerol é obtido  por hidrólise do grupo fosfato do fosfatidato, seguida por nova acilação.

Por: Renan Bardine

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